DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO EXIGE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA MEDIDA.
O artigo 37 da Constituição Federal
dispõe que a “administração pública
direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
De forma literal o
princípio da legalidade significa que a administração está obrigada àquilo que
a lei determinar. Se a lei impuser que se aja de certo modo o agente da
administração não poderá atuar de forma diversa.
Outros princípios constitucionais são o
da moralidade e o da impessoalidade. Quer isso dizer que, em havendo uma lei
que prescreva certo comportamento, a administração não poderia afrouxar a
determinação, principalmente considerando pessoa tal ou qual; ou seja, não se há
de ser mais ameno para o amigo nem extremamente rígido para o desafeto. Afinal,
não são todos iguais perante a lei?
As penas que resultam de infrações
funcionais apuradas em processos administrativos disciplinares assemelham-se
muito às penas do código penal. Veja que até para os crimes a Constituição Federal
prevê uma gradação, um escalonamento na aplicação de penas conforme a gravidade
do delito. É o que está escrito no inciso XLVI, do artigo 5º da CF/88:
“Art. 5º (...)
XLVI - a
lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
Para os crimes mais graves
e repugnantes, a restrição ao maior bem que o ser humano pode dispor: a
liberdade. Em seguida, a perdição dos bens obtidos de forma ilícita. Nos casos
mais leves, a multa, a prestação de serviços ou, ainda, a suspensão do direito
de guiar automóvel, por exemplo.
A essa gradação dá-se o
nome de proporcionalidade e razoabilidade da pena. Quem deixa licenciar o
veículo não pode ter a liberdade restringida. Quem comete homicídio contra um
idoso paraplégico não pode ser penalizado com o pagamento de cestas básicas.
No processo
administrativo disciplinar a gradação com base na razoabilidade e na
proporcionalidade também há de ser observada, sob pena de se cometer
ilegalidade.
E essa coluna é preparada
após a leitura de decisão proferida pelo Ministro Arnaldo Esteves Lima, do STJ,
no processo denominado Ação Rescisória, de nº. 5.181-PE e ajuizado pela
Procuradoria do Estado de Pernambuco.
Busca a advocacia do
estado de Pernambuco desfazer os efeitos de uma decisão de última instância proferida
no Mandado de Segurança nº. 16.536-PE, em que um servidor público Fiscal do
Tesouro Estadual fora demitido em razão de decisão proferida em processo
disciplinar por haver efetuado um lançamento a menor no valor de R$ 150,00,
durante certo procedimento tributário.
Ao investigar a decisão
proferida no Mandado de Segurança constatamos que o STJ reverteu a pena de
demissão aplicada ao servidor fazendário porque restou configurada a
desproporcionalidade e a falta de razoabilidade da punição imposta. Conforme o resumo
contido na Ação Rescisória 5.181-PE a pena era demasiada, pois: a) o valor era
insignificante, diante das responsabilidades cometidas ao servidor; b) o
servidor tentou a todo custo indenizar o erário a “vultosa” quantia, não havendo
prejuízo aos cofres públicos.
Conclui-se então, que à
administração não cabe somente a mera interpretação literal do texto da lei. O
princípio da legalidade, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, é
mais amplo e demanda a conformação dos atos estatais ao ordenamento jurídico
como um todo, plexo este que não se resume apenas à ao texto isolado da lei. E
a Constituição é parte do ordenamento, exigindo de todos incondicional
respeito.
Por outro lado, muitos diplomas
estaduais que versam sobre processo administrativo estabelecem a necessidade de
proporcionalidade. Este é o caso da Lei Federal nº. 9.784/1999, que prevê em
seu artigo 2º:
“Art. 2o A
Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade,
finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla
defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.”
E no estado de São Paulo a
Lei Estadual nº. 10.177/98 prescreve:
“Artigo 4º
- A Administração Pública atuará em obediência aos princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, interesse
público e motivação dos atos administrativos.”
Por todo o exposto, finalizamos
afirmando que a demissão imposta a servidor público há de decorrer do devido
processo legal, e exige relação de proporcionalidade e razoabilidade entre a
infração e a pena cominada, pois do contrário em vez de legalidade o Estado
estará praticando covarde ilegalidade.