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segunda-feira, 3 de junho de 2013

MÉDICO-LEGISTA POLICIAL E A ACUMULAÇÃO DE CARGOS E FUNÇÕES PÚBLICAS.

1 - INTRODUÇÃO.
A presente análise surge após a leitura do Parecer PA-3 nº. 148/99[1], da lavra do Procurador do Estado Chefe da 2ª Seccional da 3ª Subprocuradoria – PGE/SP, o Dr. Carlos Ari Sundfeld, sumidade em Direito Administrativo. Trata-se de consulta formulada por médico-legista da Polícia Civil do Estado de São Paulo quanto à possibilidade de acumular, além do cargo de médico-policial, outro cargo ou função pública.

Chamou a nossa atenção a justificativa mencionada pelo parecerista para fundamentar opinião negativa quanto à acumulação, razão pela qual - e não obstante a autoridade do parecerista, advogado do Estado - sentimo-nos na obrigação de avaliar com maior profundidade a questão.

2 – DA IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO: A JUSTIFICATIVA DA PROCURADORIA DO ESTADO.
A justificativa pela inviabilidade da acumulação resumiu-se à invocação da Lei Complementar Estadual nº. 207/79, mais precisamente quanto ao artigo 44 da citada norma, o qual dispõe:
“Artigo 44 - Os cargos policiais civis serão exercidos necessariamente em regime especial de trabalho policial, que se caracteriza: 
I - pela prestação de serviço em jornada de, no minimo, 40 (quarenta) horas semanais de trabalho, em condições precárias de segurança;
II - pelo cumprimento de horário irregular, sujeito a plantões noturnos e chamados a qualquer hora; 
III - pela proibição do exercício de outras atividades remuneradas, exceto as relativas ao ensino e à difusão cultural.”

Importante consignar que vigia, à época da edição da LCE nº. 207/79, a Constituição Federal de 1967, com as alteações decorrentes da EC nº. 01/69. No tocante à acumulação, previa o texto que:
“Art. 99. É vedada a acumulação remunerada de cargos e funções públicas, exceto:
I - a de juiz com um cargo de professor;
II - a de dois cargos de professor;
III -a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; ou
IV - a de dois cargos privativos de médico.
§ 1º Em qualquer dos casos, a acumulação somente será permitida quando houver correlação de matérias e compatibilidade de horários.
§ 2º A proibição de acumulação estende-se a cargos, funções ou empregos em autarquias, emprêsas públicas e sociedade de economia mista.
§ 3º Lei complementar, de iniciativa exclusiva do Presidente da República, poderá estabelecer, no interêsse do serviço público, outras exceções à proibição de acumular, restritas a atividades de natureza técnica ou científica ou de magistério, exigidas, em qualquer caso, correlação de matérias e compatibilidade de horários.
§ 4º A proibição de acumular proventos não se aplica aos aposentados, quanto ao exercício de mandato eletivo, quanto ao de um cargo em comissão ou quanto a contrato para prestação de serviços técnicos ou especializados.”

Pois bem. Segundo o parecer, a LCE nº. 207/79, ao dispor sobre o Regime Especial de Trabalho Policial, estabeleceu as condições do RETP e, a partir daí, impossibilitou qualquer outra acumulação, exceto aquela mencionada no inciso III, do artigo 44 da lei. 

De acordo com regime constitucional vigente à época, a acumulação era excepcional, restrita às hipóteses do artigo 99 da CF. Veja ademais que à Constituição Estadual de então não fazia restrições à acumulação de cargos, limitação que existia somente no âmbito da Constituição Federal de 1967, alterada pela EC nº. 01/69

Além da invocação do artigo 44 da LCE nº. 207/79, fez-se menção sobre a extrema flexibilidade e irregularidade da jornada de trabalho do servidor policial, que em situações extremas é de no mínimo 40 horas semanais. A necessidade de compatibilidade de horários também foi considerada impeditivo para a acumulação.

No nosso entendimento, contudo, não poderia haver a proibição de acumular, porque não há impedimento constitucional.

3 – DA POSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO DIANTE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.
A Constituição Federal de 1988 tratou da acumulação de cargos e funções, originalmente, da seguinte forma:
“Art. 37 (...)
(...)
XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários:
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico;
c) a de dois cargos privativos de médico; 
XVII - a proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações mantidas pelo Poder Público;”

 Com a EC nº. 19/1998, a acumulação passou a ser tratada do seguinte modo:
“Art. 37. (...)
(...)
XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
b) a de um cargo de professor com outro técnico ou científico; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
c) a de dois cargos privativos de médico; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
XVII - a proibição de acumular estende-se a empregos e funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista, suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Na EC nº. 34/2001, a acumulação pelos profissionais da saúde (e não só a do médico) foi contemplada na letra “c” do inciso XVI, contido no artigo 37:
                                           “Art. 37. (...)
                                           XVI
                                           (...)
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 34, de 2001)
                           
Vejamos portanto que, entre a redação original do inciso XVI e a modificação que lhe deu a EC nº. 19/1998, a acumulação era permitida para dois cargos privativos de médico. Ora, diante dessa situação e dos argumentos expostos no citado parecer da PGE/SP, o cargo de médico-legista, muito embora integre as carreiras policiais no estado de São Paulo, pode ser ocupado por um engenheiro? Não, somente pode ser ocupado exclusivamente, privativamente por médico.

Tanto lá (idos de 1979) como cá (após a CF/1988) a acumulação de cargos privativos de médico era constitucionalmente aceita. Apesar disso, em 2001, a EC nº. 34 alterou novamente a disciplina do tema e passou a prever, a partir de então, que a acumulação lícita se estendia a dois cargos de profissionais de saúde (não mais dois cargos privativos de médico) com profissões regulamentadas; as profissões na área de saúde tinham de ser regulamentadas.

O parecer invocou a existência de lei (a LCE nº. 207/79) que vedava a acumulação exceto para o caso do magistério. No entanto, a Constituição Federal é o ápice do ordenamento. Todas as leis e atos administrativos devem ser compatíveis com os preceitos da CF/88. Se uma lei posterior à Constituição Federal de 1988 for com ela incompatível, a lei sera inconstitucional. Se a lei for anterior à CF e ainda assim apresentar-se incompatível, considera-se que a lei rejeitada pelo ordenamento justamente por afrontar a nova Constituição. Em ambos os casos, vale o texto da Constituição Federal.

Ademais, o artigo 5º da CF dispõe que todos “são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...)”. E por lei deve-se considerar também a Constituição Federal (a Lei Maior), em cujo preâmbulo constou: “Nos, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos (...)”.

4 – CONCLUSÃO.
À vista do exposto, s.m.j. não nos parece constitucional a vedação de acumulação de cargos ao médico-legista que integre carreira policial. Já na CF/67 e, depois, na CF/88 antes mesmo da EC nº. 34/2001 a acumulação de cargos privativos de médico era constitucionalmente permitida. A impossibilidade de acumulação deverá ser compreendida somente dentro dos limites fixados pela CF, quais sejam: cargo técnico acumulável com um de professor; cargo privativo de médico acumulável com outro cargo privativo de profissionais de saúde; necessidade de compatibilidade de horários.

Quanto ao disposto no inciso LIV, do artigo 63 da LCE nº. 207/78, somente haveria transgressão disciplinar se houvesse a incompatibilidade de horários entre as funções exercidas, ou, se em razão do RETP na carreira policial, houvesse a impossibilidade de médico-legista cumprir as suas obrigações funcionais junto ao cargo que ele porventura acumule fora da seara da segurança pública. 

Por último, indisponibilidades técnicas impedem, da data deste artigo, o acesso aos julgados proferidos pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. No entanto, uma rápida consulta aos julgados do TJ/RJ apontam que policiais militares têm obtido provimentos judiciais que autorizam e reconhecem a possibilidade de acumulação de cargos privativos de profissionais de saúde.

De outro lado, o acórdão proferido na Ação Declaratória de Inconstitucionalidade nº. 1.541-9, do Mato Grosso do Sul, reforça a nossa convicção de que somente se consideram inacumuláveis as situações não permitidas pela Constituição Federal, o que não é o caso dos médico-legista.  

** Informação final: o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme apurado, vem reconhecendo a possibilidade de acumulação lícita a servidores policiais na linha do raciocínio acima exposto. 

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

STF JULGA CASO ENVOLVENDO ADEQUAÇÃO DE JORNADA DE TRABALHO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS E REDUÇÃO DE VENCMENTOS DE SERVIDORES PÚBLICOS


Pauta de julgamentos previstos para a sessão plenária desta quinta-feira (17)
Mandado de Segurança (MS) 25875
Relator: Ministro Marco Aurélio
Emanuel Mazza de Castro x Presidente do Tribunal de Contas da União
Mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do presidente do TCU que determinou aos ocupantes do cargo de analista de controle externo, especialidade medicina, que optassem por uma das jornadas de trabalho e respectiva remuneração equitativa estabelecidas pela Lei nº 10.356/2001.

Alegam os médicos terem direito à jornada de 20 horas semanais, com amparo em regime especial previsto na Constituição, bem como na legislação especial que regulamenta a jornada de trabalho da categoria (Lei nº 9.436/97), sem alteração nos seus vencimentos. Citam precedentes do STF no julgamento do MS 25027.

Em discussão: Saber se os médicos têm direito líquido e certo à jornada de trabalho de 20 horas e se o ato atacado ofende ao princípio da irredutibilidade de vencimentos. PGR opina pela denegação da segurança.

O julgamento será retomado hoje, 17/11, após o voto-vista do ministro Dias Toffoli.
Fonte: STF, acessado em 17/11/2011.