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quarta-feira, 5 de agosto de 2020

COVID-19 E DIREITOS TRABALHISTAS: EMPRESA QUE FECHA DEVE GARANTIR ESTABILIDADE A TRABALHADOR.

Além dos danos à saúde da população, a pandemia de COVID-19 tem provocado catástrofes econômicas. Estabelecimentos comerciais (lojas, restaurantes), de serviços (salões de beleza) e industriais (fábricas) tiveram de seguir as necessárias medidas de distanciamento e isolamento social, reduzindo quase totalmente o seu funcionamento.

E apesar das medidas de retorno gradual das atividades econômicas, a população está receosa porque ninguém tem condição de adivinhar como o seu organismo reagirá à doença. Será só uma ‘gripezinha” ou correrá o risco de enfrentar uma UTI, com sério risco para a sua vida?

E apesar do esforço de todos, certamente haverá casos em que o empresário preferirá encerrar as suas atividades ou, por não ter mais condição de prosseguir, será obrigado a fechar o seu estabelecimento. Em muitos casos, sem quitar todos os direitos de seus empregados. Isso pode se dar por impossibilidade econômica ou por mera “esperteza” do empregador, que preferirá barganhar um bom acordo na Justiça do Trabalho.

Mas imagine que ao fechar a empresa, haja empregados que tenham o direito à estabilidade. Neste caso, recentemente, a Justiça do Trabalho reconheceu que o “Fechamento da empresa não afasta direito de empregado à estabilidade por acidente de trabalho”.  O acidente de trabalho é uma das causas de estabilidade no emprego, mas há outras situações de estabilidade, como no caso de empregada gestante, ocupante de certas funções sindicais, etc.

Veja os detalhes da decisão proferida pelo TST – Tribunal Superior do Trabalho[1]:

“A garantia provisória do emprego, nesse caso, tem caráter social.

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou à Ferglass Indústria Comércio de Ferragens Ltda., de Cambuci (SP), já extinta, o pagamento de indenização substitutiva referente ao período de estabilidade de um empregado. Segundo o colegiado, no caso de extinção da empresa, o empregado com estabilidade decorrente de acidade de trabalho tem direito à indenização correspondente ao mesmo período.

 Acidente

Na reclamação trabalhista, o empregado explicou que, em dezembro de 2015, sofreu acidente a caminho do trabalho, quando sua motocicleta foi atingida por outro veículo. Em decorrência do rompimento de um tendão, teve de fazer cirurgia e fisioterapia. Ao ser dispensado, três meses depois de voltar ao trabalho, pediu o reconhecimento do direito à estabilidade acidentária, que asseguraria a manutenção do contrato de trabalho por no mínimo 12 meses.

 Fim das atividades

Na contestação, a Ferglass sustentou que, em junho de 2016, encerrou suas atividades e rescindiu o contrato de todos os empregados, entre eles o autor da ação. Argumentou, ainda, que o afastamento se dera por auxílio-doença, e não auxílio-doença acidentário, e que o acidente não se caracterizava como acidente de trabalho.

 Estabilidade provisória

O pedido foi julgado improcedente pelo juízo da 87ª Vara do Trabalho de São Paulo (SP), que concluiu que o INSS não havia reconhecido o episódio como acidente de trabalho. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), embora reconhecesse que se tratou de acidente de trajeto, entendeu que a estabilidade somente é devida enquanto a empresa estiver ativa. ”Nessa hipótese, a dispensa não se caracteriza como ato ilícito do empregador, mas apenas consequência de conjunturas econômicas que impediram o prosseguimento da atividade”, registrou o TRT.

 

Caráter social

A relatora do recurso de revista do empregado, ministra Delaíde Miranda Arantes, explicou que a estabilidade provisória decorrente de acidente de trabalho tem caráter social, de modo que, com o encerramento da empresa, é devida a indenização correspondente ao período.”

Veja aqui a decisão.

Comentários do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira: Para a dispensas lícita do empregado, mesmo diante do encerramento de suas atividades, o empregador deveria incluir no pagamento das verbas rescisórias o valor relativo ao período de estabilidade legalmente assegurada ao empregado. Mas quando se iniciaria o período de estabilidade? Quando o empregado estaria apto a retornar às suas atividades? Nem sempre é possível prever...

Mas apesar do recente julgado do TST, já houve (e certamente ainda há!) decisões contrárias em casos semelhantes, principalmente nas instâncias inferiores, conforme notícia publicada em 04/2019[2] sobre esta decisão. Ora, e como fica o caput do art. 5º da CF/88, que determina “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (...)”?!


[1] https://www.tst.jus.br/web/guest/-/fechamento-da-empresa-n%C3%A3o-afasta-direito-de-empregado-%C3%A0-estabilidade-por-acidente-de-trabalho, acessado em 05/08/2020.

[2]https://www.migalhas.com.br/quentes/299683/nao-ha-estabilidade-de-emprego-de-gestante-se-empresa-fechou-por-despejo#:~:text=N%C3%A3o%20h%C3%A1%20estabilidade%20de%20emprego%20de%20gestante%20se%20empresa%20fechou%20por%20despejo,-0&text=Por%C3%A9m%2C%20o%20sentido%20da%20norma,de%20seu%20poder%20de%20disposi%C3%A7%C3%A3o.%E2%80%9D, acessado em 05/08/2020.

terça-feira, 4 de agosto de 2020

COVID-19 E INDENIZAÇÃO A PROFISSIONAIS DA SAÚDE: PRESIDENTE BOLSONARO VETA A LEI. ENTENDA OS MOTIVOS.

É fato notório que os profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e afins) são os trabalhadores mais expostos e os mais infectados pelo COVID-19. Não por acaso, em razão da elevada carga viral a que são expostos em seus ambientes de trabalho, foram os primeiros a participarem dos testes finais das duas vacinas contra o COVID-19.


Daí ter sido proposto e aprovado pelo Poder Legislativo (deputados e senadores) o Projeto de Lei nº 1.826, de 2020 que, reconhecendo o COVID-19 como doença ocupacional dos profissionais de saúde, concedia-lhes reparações financeiras pelos prejuízos sofridos durante o desempenho das atividades de atendimento no combate à COVID-19, notadamente no SUS.


Mas aprovada a Lei pelos deputados e senadores (Poder Legislativo), o Presidente Jair Bolsonaro recusou-lhe a sanção (aprovação do PL) sob a justificativa de suposta contrariedade à Lei Complementar nº. 173/2020[1]. Constou do Veto Presidencial o seguinte:


“Apesar do mérito da propositura e a boa intenção do legislador em determinar o pagamento de indenização pela União para familiares de profissionais de saúde que atuam diretamente no combate à pandemia e venham a falecer, bem como para aqueles que ficaram incapacitados permanentemente para o trabalho, a proposta, ao impor o apoio financeiro na forma do projeto, contém os seguintes óbices jurídicos.

 

A proposta viola o art. 8º da recente Lei Complementar nº 173, de 2020, por se estar prevendo benefício indenizatório para agentes públicos e criando despesa continuada em período de calamidade no qual tais medidas estão vedadas.

O segundo óbice está na falta de apresentação de estimativa do impacto orçamentário e financeiro, em violação às regras do art. 113 do ADCT.

  

Ademais da violação ao art. 113 do ADCT, tendo em vista que o período do benefício supera o prazo de 31.12.2020 (Art. 1º do Decreto Legislativo nº 6 de 2020), revela-se incompatível com os arts. 15, 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, cuja violação pode acarretar responsabilidade para o Presidente da República.

 

O terceiro problema é a inconstitucionalidade formal, por se criar benefício destinado a outros agentes públicos federais e a agentes públicos de outros entes federados por norma de iniciativa de parlamentar federal, a teor do art. 1º e art. 61 § 1º da Constituição.


Sobre a citada Lei Complementar nº 173/2020, eis o seu disciplinamento:


“Art. 7º A Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 21. É nulo de pleno direito:

I - o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda:

a) às exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei Complementar e o disposto no inciso XIII do caput do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição Federal; e

b) ao limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo;

II - o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

III - o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

IV - a aprovação, a edição ou a sanção, por Chefe do Poder Executivo, por Presidente e demais membros da Mesa ou órgão decisório equivalente do Poder Legislativo, por Presidente de Tribunal do Poder Judiciário e pelo Chefe do Ministério Público, da União e dos Estados, de norma legal contendo plano de alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público, ou a edição de ato, por esses agentes, para nomeação de aprovados em concurso público, quando:

a) resultar em aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo; ou

b) resultar em aumento da despesa com pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo.

 

Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:
I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;

III - alterar estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

V - realizar concurso público, exceto para as reposições de vacâncias previstas no inciso IV;

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado, ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins.
§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.
§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica em caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei ou o ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo vedada qualquer cláusula de retroatividade.

§ 4º O disposto neste artigo não se aplica ao direito de opção assegurado na Lei nº 13.681, de 18 de junho de 2018, bem como aos respectivos atos de transposição e de enquadramento.

§ 5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo não se aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 6º (VETADO).

Art. 9º Ficam suspensos, na forma do regulamento, os pagamentos dos refinanciamentos de dívidas dos Municípios com a Previdência Social com vencimento entre 1º de março e 31 de dezembro de 2020.
§ 1º (VETADO).

§ 2º A suspensão de que trata este artigo se estende ao recolhimento das contribuições previdenciárias patronais dos Municípios devidas aos respectivos regimes próprios, desde que autorizada por lei municipal específica.

Art. 10. Ficam suspensos os prazos de validade dos concursos públicos já homologados na data da publicação do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, em todo o território nacional, até o término da vigência do estado de calamidade pública estabelecido pela União.

§ 1º (VETADO).

§ 2º Os prazos suspensos voltam a correr a partir do término do período de calamidade pública.

§ 3º A suspensão dos prazos deverá ser publicada pelos organizadores dos concursos nos veículos oficiais previstos no edital do concurso público.”


Ao que tudo indica, apesar das justificativas jurídicas para o veto ao PL originado do Poder Legislativo, e acaso haja vontade política do Chefe do Executivo, os óbices poderão ser facilmente superados, mediante:

a) Elaboração de PL de iniciativa do Sr. Presidente da República;

b) Em conjunto com os ministérios da Economia e Planejamento, proceder ao levantamento dos impactos financeiros e fontes de financiamento, prevendo mecanismos de compensações para evitar a alegada incidência na LRF; e

c) Apesar de alegada violação a preceitos do art. 8º da LC nº 173//2020, as vedações ali contidas se aplicariam à criação de vantagens e/ou direitos que se assemelhem aos “penduricalhos”.


Certo contudo que o Poder Legislativo (deputados e senadores) pode derrubar o veto do Sr. Presidente da República. E uma vez derrubado o veto, o PL se transforma em lei, gerando todos os efeitos típicos. Se assim vier a ocorrer, restará ao Presidente da República recorrer ao STF para que seja decretada eventual inconstitucionalidade do ato. 


Veja aqui a mensagem de Veto do Presidente