LEGALIDADE, ORDEM E PROGRESSO: RETOMADA DE PRÉDIOS PÚBLICOS NÃO EXIGE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL.
Desde 2013 a sociedade brasileira experimenta, de
forma coletiva, o legítimo exercício da livre expressão da opinião e do pensamento
em relação à atuação dos Poderes constituídos: Executivo (Presidente,
governadores e prefeitos), Legislativo (senadores, deputados e vereadores) e
Judiciário e Justiça (juízes, tribunais, Ministério Público, advocacia). Os
cidadãos não reclamavam dos R$ 0,20 (valor do reajuste das tarifas de ônibus,
à época); exigiam serviços “Padrão FIFA”.
O amadorismo dos nossos políticos foi apimentado com os 7 X
1 (Alemanha vs. Brasil) durante os jogos da Copa do Mundo.
Ocuparam-se ruas, avenidas... Escolas!
Movimentos legítimos, outros nem tanto. Difícil é identificar a honestidade de propósitos de tantos protestos e protestantes.
O ditado popular “Pau que dá em Chico dá em Francisco”
serve para os políticos do Legislativo. “Pau que dá em Cunha[1]
dá em Capez[2].
Afinal, segundo a Constituição Federal,“Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (...).”
Todavia, o cidadão comum, passados os momentos de protesto ou
de revoltas sociais, precisa tocar a sua vida a caminho de um futuro que se espera seja melhor do que o presente.
Por este motivo, não se admite o bloqueio de vias que
impeçam aos indivíduos o direito de ir e vir (trabalho-escola-lar e vice-versa),
por exemplo. As manifestações devem respeitar, também, o inc. XVI, do art. 5º
da CF, que prescreve:
“XVI - todos
podem reunir-se pacificamente,
sem armas, em locais abertos ao público,
independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião
anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;”
Pelas mesmas razões não se admite a paralisação completa
de serviços públicos essenciais, a saber: saúde, segurança, educação, limpeza urbana,
transportes.
No campo da educação, a verdadeira “Pátria
Educadora” se faz com escolas de portas abertas e professores ensinando aos
alunos, estes sim famintos e sedentos por formação útil, honesta.
E de modo geral, é indispensável a manutenção da “Ordem”
para se atingir o “Progresso”.
A “ocupação pacífica” de escolas estaduais tem
merecido destaque por parte da mídia. Mas a quem interessa o fechamento
prolongado de escolas? A tomada de escolas pode ser uma forma de
protesto, mas não é unanimidade! Muitos outros pais e alunos preferem receber,
do Estado e dos seus professores, o serviço público denominado “educação”.
A cada escola ocupada, uma notícia em jornais, TV... e um
novo processo de reintegração de posse na Justiça. Com a judicialização, entram
em campo os juízes, que muitas vezes geram insegurança para governos e
cidadãos. Um juiz decide “X”, o outro decide desfazer; um terceiro manda fazer
“Y”. Escolas
ocupadas, alunos sem aula, servidores impossibilitados de trabalharem e parcela
da sociedade cobrando de seus governantes a prestação do serviço público
“educação”.
O governante, gestor eleito pelo Povo, é cobrado a dar
solução. Solução que agrade a todos.
Foi divulgado que o governo do Estado estaria
“invadindo”, “sem ordem judicial”, escolas “ocupadas pacificamente”. Não é bem
assim, não!
Dias atrás houve a invasão, a "ocupação" sem permissão
da sede administrativa do Centro Paula Souza. A Administração Pública obteve
ordem judicial para a retirada dos invasores. Apesar da decisão,
outro juiz de mesmo escalão (primeira instância), praticamente anulou a ordem que
deveria ser executada. Este último juiz impôs condições para a reintegração: i) proibição
do uso de armas pela Polícia Militar; ii) acompanhamento da PM pelo Secretário
de Segurança.
Quantas vezes você, leitor, foi atendido em uma
ocorrência pelo Secretário de Segurança? Se invadirem a sua casa e você acionar
a PM seria justo, com você, que a detenção do invasor fosse realizada
somente com a presença do Secretário de Segurança? Qual a função de
milhares de policiais civis e militares, de diversas patentes e níveis de
autoridade, distribuídos em todo o Estado?
A Consultoria Jurídica da Administração Pública
estadual, em boa hora, emitiu parecer embasando juridicamente a possibilidade
de o Estado retomar, de invasores, não só escolas mas todo e qualquer tipo de prédio em que funcione repartição ou serviço público
sem a necessidade de “autorização” judicial.
Entraram abusivamente sem autorização do
“dono”, mas podem exigir permissão da Justiça para serem retirados?
Quanta falta de lógica!
O parecer da Procuradoria Geral do Estado (PGE)
aponta, de forma consistente, que o Poder Público deve zelar pela manutenção e
pela integridade dos bens públicos. E o chamado poder de tutela do Estado.
Segundo o referido parecer, a Administração Pública
tanto pode valer-se da autotutela como pode, se assim desejar, recorrer ao
Poder Judiciário.
Certamente, a autotutela será, em muitos
casos, mais eficiente e eficaz do que os demorados processos judiciais. Trata-se de concretização do princípio da eficiência, referido no art. 37 da CF.
É preciso ressaltar que a autotutela não se confunde com
liberdade de abusar, de extrapolar. A autotutela e o uso da força
devem ser proporcionais ao estritamente necessário para o zelo da coisa
pública. Neste ponto o parecer da PGE foi muito claro:
“Se até mesmo ao particular é excepcionalmente
garantida, em caso de turbação ou esbulho, o exercício da autotutela,
certamente a Administração Pública também pode exercê-la.
(...)
A operacionalização da atuação Administrativa deve se dar
(...) não desconsiderando ‘que os atos de
defesa ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção ou
restituição, da posse’ ”. Destacamos.
Estão dadas as condições para que o Estado repila o
mau uso, a “privatização” de espaços e bens públicos de interesse da
coletividade. Se você pode defender a sua posse, por qual motivo o Estado
estaria impedido de preservar o bem público. Neste sentido, o art. 1.210 do
Código Civil, que foi referido na manifestação da PGE/SP:
“Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na
posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência
iminente, se tiver justo receio de ser molestado.
§ 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá
manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os
atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à
manutenção, ou restituição da posse.”.
Repita-se: a atuação da força pública não pode ser
abusiva, arbitrária, sob pena de responsabilidade civil o Estado,
com base no § 6º, do art. 37 da CF:
“§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de
direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que
seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”.
Não obstante a lucidez do Parecer da PGE/SP, a OAB/SP,
em dispensável movimento midiático emitiu Nota Pública[3].
Quem será realmente prejudicado? O "ocupante pacífico" ou o aluno sem aula?
Veja aqui o Parecer da PGE/SP.
[1] Eduardo Cunha, Deputado
Federal então Presidente da Câmara dos Deputados, afastado por decisão do STF.
[2] Fernando Capaz, Deputado Estadual, Presidente
da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e acusado de envolvimento com
a “Máfia da Merenda”.
[3] A OAB SP vem manifestar preocupação
em face do uso de forças policiais, sem autorização judicial, para desocupação de estudantes
em escolas públicas, baseando-se o governo do Estado em parecer lavrado pela
Procuradoria-Geral do Estado.
O
Código Civil de fato autoriza que o possuidor possa usar da própria força
(autotutela) para fazer parar turbação ou esbulho em sua propriedade, contanto
que o faça logo e que a reação seja apenas a necessária para a manutenção ou
restituição da posse (art.
1210, § 1ª, do Código Civil brasileiro). Esse dispositivo protege tanto patrimônio público, quanto privado.
Todavia,
ordem de autoridade governamental
objetivando o uso da força institucionalizada para a finalidade de reintegração
de posse é ato administrativo que se sujeita aos princípios da razoabilidade e
proporcionalidade.
Em
se tratando de invasão pacífica
e não predatória, de estabelecimento de ensino oficial,
por jovens que lá estudam,
parece desarrazoado proceder a
reintegração manu
militari, sem a prévia
cautela de ordem judicial e,
assim, levada a efeito da forma menos violenta possível.
O
próprio Estado Administração ficará também melhor resguardado, e a sociedade
civil mais reconfortada.