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quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

FALTAS ESCOLARES SERÃO COMUNICADAS AO CONSELHO TUTELAR.



Em 10/01/2019 foi publicada a Lei Ordinária Federal nº. 13.803/19, que deu nova redação ao art. 12 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), ao “obrigar a notificação de faltas escolares ao Conselho Tutelar quando superiores a 30% (trinta por cento) do percentual permitido em lei.”. Confira a redação do texto legal:
“Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
(...)
VIII – notificar ao Conselho Tutelar do Município a relação dos alunos que apresentem quantidade de faltas acima de 30% (trinta por cento) do percentual permitido em lei;”.

A assiduidade escolar é aferida a partir do número de aulas e do comparecimento do aluno às aulas e atividades escolares. A ausência escolar compromete o aprendizado da criança e do adolescente, além de, ao final, configurar desperdício de recursos públicos.
Por outro lado, a falta de interesse da criança e do adolescente pelo ambiente educacional pode revelar algo também muito sério: o bullying[1].

E uma vez constatado que a criança ou o adolescente estão sendo vítimas de opressão, estará aberta a possibilidade de eficaz e adequado enfrentamento do problema.

A medida indicada pela nova redação legal, muito mais do que aprimorar a legislação educacional, cumpre dever constitucional indicado nos arts. 205, 208 e 227 da Carta Magna:
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
(...)
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009) 
(...)
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.  (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)

É dever do Estado, da sociedade e da família propiciar a adequada oferta educacional à criança ou adolescente. O dever de notificação de ausências (quando superar o limite de 30%), introduzido na lei, indica que o Estado e a sociedade estarão vigilantes em relação aos cuidados da família para com a criança ou adolescente. Cabe à família fazer com que os filhos estudem. Se isto não acontecer, o Estado (unidades escolares) e a sociedade (conselhos tutelares), a partir de agora, deverão atuar de forma preservar o interesse da criança ou do adolescente.

A atuação do Conselho Tutelar é regrada pelos art. 131 e seguintes do Estatuto da Criança e do Adolescente:
“Art. 131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei.
(...)
Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:
I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII;
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII;
III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações.
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente;
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional;
VII - expedir notificações;
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário;
IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente;
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;
XI - representar ao Ministério Público, para efeito das ações de perda ou suspensão do pátrio poder.  
XI - representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou suspensão do poder familiar, após esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente junto à família natural. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
XII - promover e incentivar, na comunidade e nos grupos profissionais, ações de divulgação e treinamento para o reconhecimento de sintomas de maus-tratos em crianças e adolescentes. (Incluído pela Lei nº 13.046, de 2014)
Parágrafo único.  Se, no exercício de suas atribuições, o Conselho Tutelar entender necessário o afastamento do convívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao Ministério Público, prestando-lhe informações sobre os motivos de tal entendimento e as providências tomadas para a orientação, o apoio e a promoção social da família. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) 
Art. 137. As decisões do Conselho Tutelar somente poderão ser revistas pela autoridade judiciária a pedido de quem tenha legítimo interesse.”

A lei acrescenta o dever de efetiva vigilância do Estado (unidade de ensino) e da sociedade sobre a assiduidade do aluno. Portanto, de controle e de prevenção contra a negligência e o abandono familiar da criança ou adolescente em idade escolar.

[1]Bullying é um termo da língua inglesa (bully = “valentão”) que se refere a todas as formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas, que ocorrem sem motivação evidente e são exercidas por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo de intimidar ou agredir outra pessoa sem ter a possibilidade ou capacidade de se defender, sendo realizadas dentro de uma relação desigual de forças ou poder. O bullying se divide em duas categorias: a) bullying direto, que é a forma mais comum entre os agressores masculinos e b) bullying indireto, sendo essa a forma mais comum entre mulheres e crianças, tendo como característica o isolamento social da vítima. Em geral, a vítima teme o(a) agressor(a) em razão das ameaças ou mesmo a concretização da violência, física ou sexual, ou a perda dos meios de subsistência.” Disponível em https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/bullying.htm, acessado em 16/01/2019.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Justiça gaúcha reconhece a incompetência do Estado no atendimento e no cumprimento do ECA.

"Negada responsabilização de mãe por evasão escolar da filha

A 8ª Câmara Cível do TJRS negou provimento à ação do Ministério Público que buscava punir mãe por omissão em relação à evasão escolar da filha. Para os Desembargadores, o Estado deve primeiro demonstrar ter cumprido sua parte na proteção integral à criança e ao adolescente, incluindo ela e sua família em rede de proteção.



No 1º Grau, a Juíza Tânia Cristina Dresch Buttinger, da Comarca de Flores da Cunha, já havia indeferido o pedido do MP de condenar a mãe à prestação de pena pecuniária. No recurso ao TJ, o Ministério Público alegou que a mãe da menina descumpriu seus deveres inerentes ao poder familiar (art. 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente , ECA), bem como desrespeitou as medidas aplicadas pelo Conselho Tutelar. Referiu ainda que o irmão da menina também não frequenta a escola e não concluiu o ensino fundamental, demonstrando que não se trata de um problema específico em relação à filha.



Apelação
Para o relator da ação, Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, nos casos de infrequencia escolar de adolescente, somente é admissível a punição dos pais quando a inicial da ação demonstrar que o Estado fez sua parte na política de proteção integral à criança e ao adolescente. Ressaltou que a mera notificação do Conselho Tutelar, sem investigação criteriosa do contexto social da família, não é suficiente.
Salientou que a mãe da menina, à época dos fatos, trabalhava na plantação e colheita de morangos e, por isso, saía de casa pela manhã, ficando a cargo dos filhos o desempenho das atividades escolares. Enfatizou que a mulher é pessoa muito simples, com baixa instrução. Ainda, lembrou que a menor afirmou ao próprio MP não estar se adaptando à escola, pois era zombada pelos colegas em razão das roupas que usava. O magistrado apontou que, mesmo com essas informações, Ministério Público e Conselho Tutelar não buscaram cumprir o seu dever, incluindo a família em na rede de proteção estatal.



Concluiu que diante desse triste realidade, soa absurdo que o Estado, que não cumpre adequadamente com seus misteres, compareça perante aquela unidade familiar apenar para dar uma aparência de cumprimento formal, fazendo recair sobra a cabeça dessas pessoas os rigores da lei, com aplicação de uma penalidade pecuniária que nenhum sentido ou eficácia possui. Ressaltou ainda que, desde fevereiro de 2010 a menina vem frequentando regularmente outra escola.



A decisão é do dia 12/5. Os Desembargadores Alzir Felipe Schmitz e Ricardo Moreira Lins Pastl acompanharam o voto do relator."



Apelação Cível nº 70040774499
Fonte: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul



**Comentários do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira
Mais uma bela demonstração da distribuição da justiça e do reconhecimento de deveres aos órgãos incumbidos de atender a quem precisa, aos mais necessitados.
A Justiça gaúcha, de primeira e de segunda instância, aplicou o Direito, revelou os direitos e os deveres de cada um e deu a melhor decisão ao caso concreto.
 
É sabido que a escola pública está praticamente falida. Há algumas raras exceções em que pais, alunos, professores e a comunidade diretamente interesada cultivam uma escola quase ideal. De modo geral, o abandono, o sucateamento, a inércia e a incapacidade para reter alunos e formar pessoas impera nas redes públicas.
 
Além disso, no nosso entendimento, os conselhos tutelares estão servindo somente a interesses pessoais. Quero dizer que os conselhos tutelares estão servindo com simples trampolins políticos, uma forma de capitalizar votos para as eleições locais (municipais), de modo que os eleitos para os conselhos, em muitos casos, optam somente pela política em detrimento da valorização e da aplicação do ECA.
 
O MP, por sua vez, também tem o seus momentos de falha. Em vez de zelar pela existência de vaga e escola adequada para todos, puxou a corda do lado mais fraco.
 
A mãe, no caso relatado, fez o quase impossível nos dias de hoje. Nos dias em que o consumo e a aparência estão corroendo as famílias menos privilegiadas.
 
Felizmente, mais uma decisão digna de aplausos!