Concurso público deve ter validade mínima de 2 anos
Depois que o STF passou a
decidir que há direito subjetivo à nomeação dos aprovados em concursos públicos,
a Administração passou a adotar um famigerado "cadastro reserva". São
cadastros que comportam um elevando número de "possíveis" vagas, que depois
são preenchidas na sua totalidade. Se assim ocorre - e tendo em vista a
necessidade de previsão orçamentária para as contratações -, não se pode falar
em ausência de vagas no momento da publicação do edital. O "cadastro
reserva" é uma simulação, um engodo para burlar o direito à
nomeação e à posse, já assegurando pelo STF.
Mas já há quem esteja se
debruçando sobre a questão. O artigo abaixo merece leitura, porque traz uma
abordagem interessante sobre a nova realidade do "cadastro reserva".
"Concurso público
deve ter validade mínima de 2 anos
Por Vitor Vilela Guglinski
É
de conhecimento geral entre os concurseiros os chamados cadastros de reserva –
uma espécie de lista criada pela administração pública tanto naqueles certames
em que não há vagas abertas quanto nos que existem vagas, mas que o
administrador público, antevendo a criação de novas vagas, aposentadorias
vindouras em seu quadro de funcionários, exonerações, enfim, diversas situações
em que será necessária a contratação de novos servidores, opta por formar um
cadastro de aprovados para preenchimento dessas vagas que eventualmente venham
a surgir durante o prazo de validade do concurso.
Mas, existe algum limite
jurídico para este tipo de prática por parte da Administração Pública, ou esta
pode determinar, discricionariamente, como formará e utilizará o cadastro de
reserva?
A rigor, do ponto de
vista legislativo inexiste norma específica que discipline a matéria. A
formação de cadastros de reserva é uma prática lícita, porém, em razão do poder
discricionário que caracteriza a administração pública, tem, a meu ver,
padecido de abusos.
A questão já havia sido
decidida pelo Superior Tribunal de Justiça, porém, a matéria também foi
submetida ao Supremo Tribunal Federal que, após reconhecer a repercussão geral
do tema, sedimentou, em decisão unânime, o entendimento no sentido de que
candidatos aprovados em concurso público, dentro do número de vagas, têm
direito líquido e certo à nomeação, ressalvando-se à administração pública tão
somente a escolha do momento da nomeação durante o prazo de validade do certame.
No processo, o relator, ministro Gilmar Mendes, salientou que somente em
“situações excepcionalíssimas”, como crises econômicas graves e catástrofes
naturais capazes de causar calamidade pública ou comoção interna autorizariam a
administração pública a deixar de nomear novos servidores.
É o prazo de validade do
certame que me levou a refletir sobre o assunto.
O inciso III do artigo 37
de nossa Constituição informa que o prazo de validade do concurso público será
de até dois anos, prorrogável uma vez por igual período. De imediato, da
leitura do dispositivo é possível extrair duas conclusões: 1 - que, na prática,
o prazo de validade de um concurso poderá totalizar quatro anos, a saber, os
dois anos previstos no preceptivo somados a dois anos advindos da prorrogação
legalmente autorizada pela Constituição Federal; 2 - que, obviamente, o
concurso poderá ter prazo menor que o constitucionalmente previsto.
A questão abordada neste
trabalho se situa exatamente na segunda hipótese, ou seja, naqueles casos em
que a administração pública estatui um prazo de duração menor que o
constitucionalmente autorizado para o concurso público.
Sabe-se que alguns entes
da administração direta e indireta chegam a abrir concursos prevendo o
irrisório prazo de seis meses, prorrogável por igual período. Até aí, nada de
anormal. A anormalidade passa a ocorrer no momento em que esse prazo
transcorre, e os candidatos que compunham o cadastro de reserva anteriormente
formado são surpreendidos com a abertura de um novo certame, inclusive com a
previsão de vagas.
A título de exemplo, a
Petrobras certa vez realizou um concurso com prazo de validade de seis meses,
prorrogável por igual período, visando a criação de um cadastro de reserva de
600 advogados. Cadastro criado, aquela sociedade de economia mista acabou
contratando aproximadamente de 270 aprovados, deixando os demais componentes do
cadastro “a ver navios”. O que se seguiu foi a abertura de novos concursos,
para a formação de novos cadastros, com igual prazo de validade, significando
mais frustração para aqueles não contemplados com a contratação.
Este exemplo foi somente
um dentre tantos que ocorrem no universo dos concursos públicos. Qual a razão
para isto?
Embora não haja vedação
legal em relação à formação de cadastros de reserva, penso que deveria haver,
de lege ferenda, ou até mesmo através
da provocação do STF, a regulação da matéria, pois não faz o menor sentido que um
cadastro de reserva não seja esgotado e, em seguida, seja aberto um novo
certame para a formação de novo cadastro. No mínimo, uma prática dessas fere a
moralidade administrativa, e é a frustração que milhares de concurseiros
experimentam todos os anos ao longo da árdua batalha de preparação para as
exigentes avaliações.
Qual seria a solução para
a questão?
De fato, a administração
pública não está obrigada a esgotar um cadastro de reserva formado após a
finalização de um concurso público, na medida em que há, nesse caso, mera
expectativa de direito por parte dos candidatos componentes do cadastro, ao
contrário do que ocorre no caso de vagas efetivamente existentes, em que há
direito líquido e certo à nomeação, com as ressalvas do ministro Gilmar Mendes,
acima citadas.
Contudo, de forma a
proteger a moralidade administrativa, a boa-fé, os legítimos interesses dos
candidatos, enfim, os diversos valores envolvidos no binômio
administrador/administrado, a lei ou o STF deveria determinar, expressamente,
que nos concursos em que haja cadastro de reserva, o prazo de validade seja o
máximo fixado na Constituição, isto é, dois anos, prorrogável uma vez por igual
período. Isso porque afiguram-se extremamente injustas aquelas situações como a
que narrei linhas atrás, em que os candidatos que compõem determinados
cadastros são surpreendidos com o lançamento de novo edital para a formação de
novo cadastro. Com isso, restará preservada a finalidade dos concursos
públicos, que é o provimento de vagas nos quadros do funcionalismo público.
Sendo assim, na medida em
que as vagas forem surgindo, nomeiam-se os componentes do cadastro de reserva.
Mas, e se o cadastro se esgotar e houver novas vagas? Aí sim, abre-se novo
concurso. O que não deveria ocorrer é essa farra de concursos com formação de
cadastros de reserva válidos por prazo exíguo, que mais aparentam ser fonte de
arrecadação da administração pública e das bancas examinadoras.
Se de um lado há a
discricionariedade administrativa, autorizando esta a agir conforme a
conveniência e oportunidade, de outro há as legitimas expectativas daqueles
que, de boa-fé, almejam uma ocupação no funcionalismo público, sendo certo que
estes, mesmo ante a possibilidade de esgotamento do prazo do concurso sem que
sejam chamados, continuam sendo atraídos pelas excelentes remunerações e
vantagens das carreiras públicas. Se a administração pública se vale dessa
influência psicológica do candidato para realizar concursos, sabedora de que na
realidade dificilmente haverá o surgimento de vagas durante aquele prazo que
ela mesma assinala nos editais, não há dúvidas de que estaremos diante de
flagrante enriquecimento ilícito e abuso de direito.
Por tais motivos,
reafirmo meu entendimento no sentido de que, havendo concurso com previsão de
cadastros de reserva, deveria haver lei disciplinando a matéria, prevendo que a
validade desses certames seja de dois anos, prorrogável uma vez por igual
período, ou então seja o STF provocado a se manifestar sobre o tema."
Fonte: Conjur, acessado
em 31/12/2011 em http://www.conjur.com.br/2011-dez-31/concursos-cadastro-reserva-validade-minima-anos.
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