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quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

EMPREGADO DE UBER? MINISTRO DO TST SE CONVENCE DA EXISTÊNCIA DE VÍNCULO CLT.


Conforme publicado ontem[1], a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) analisa um caso de motorista do aplicativo Uber, que foi vencido na primeira e na segunda instância, pela empresa; na primeira (juiz singular) e de segunda instância (colegiado em tribunal) não foi reconhecido o vínculo de emprego com o motorista.


No entanto, o processo foi para Brasília (TST), onde a última instância trabalhista analisa se no trabalho executado pelo motorista de Uber havia a presença de elementos essenciais para a configuração do vínculo de emprego: i) alteridade (o trabalhador não assume os riscos da atividade), ii) a subordinação (obediência às ordens e comandos da empresa), iii) a pessoalidade (a pessoa física exerce o trabalho de forma pessoal), iv) a onerosidade (o trabalho prestado é remunerado), e v) a não eventualidade (há constância e permanência da prestação do trabalho).


Trata-se do julgamento do caso nº 100353-02.2017.5.01.0066, em que o ministro Mauricio Godinho Delgado, relator do Recurso de Revista, apresentou um voto (decisão individual) decretando que, naquele caso específico em julgamento, estava provada a existência de subordinação.


A existência da subordinação é a questão de maior controvérsia em casos envolvendo motoristas e/ou prestadores de serviços por aplicativos. O principal argumento da Uber, por exemplo, é que os motoristas poderiam escolher quando e onde trabalharem, o que significaria inexistência de poder diretivo sobre os trabalhadores.


No entanto, o ministro Delgado reconheceu que no caso concreto a subordinação ficou demonstrada, pois no sistema uberizadoordens e diretrizes claras e objetivas que devem ser seguidas, havendo um "poder diretivo exercido com muita eficiência". Para ele, o Brasil é um dos poucos países do mundo que já têm legislação que serve perfeitamente a casos de uberização, referindo-se ao parágrafo único do artigo 6º da CLT, segundo o qual "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio". A subordinação por meio eletroinformático já tem disciplina na legislação, embora para o ministro Delgado, a legislação "não vem sendo prestigiada na análise do assunto".


No entanto, o julgamento foi suspenso, porque dois integrantes da 3ª Turma -  ministros Alexandre de Souza Agra Belmonte e Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira -pediram vista para melhor entendimento do caso específico.

Não é a primeira vez que o TST – Tribunal Superior do Trabalho analisa o caso. Já houve decisão contrária ao trabalhador por parte das 4ª e da 5ª Turma, respectivamente.


Por parte da 4ª Turma, a decisão não entrou no mérito, mas implicitamente reconheceu ter sido acertada a decisão de Segunda Instância (TRT), ao negar-se a apreciar um Recurso de Revista (TST-AIRR-10575-88.2019.5.03.000), decretando o seguinte:

“VI. Sob esse enfoque, fixa-se o seguinte entendimento: o trabalho prestado com a utilização de plataforma tecnológica de gestão de oferta de motoristas-usuários e demanda de clientes-usuários, não se dá para a plataforma e não atende aos elementos configuradores da relação de emprego previstos nos artigos 2º e 3º da CLT, inexistindo, por isso, relação de emprego entre o motorista profissional e a desenvolvedora do aplicativo, o que não acarreta violação do disposto no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal. VII. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento.

(...)

O trabalho pela plataforma tecnológica – e não para ela -, não atende aos critérios definidos nos artigos 2º e 3º da CLT, pois o usuário-motorista pode dispor livremente quando e se disponibilizará seu serviço de transporte para os usuários-clientes, sem qualquer exigência de trabalho mínimo, de número mínimo de viagens por período, de faturamento mínimo, sem qualquer fiscalização ou punição por esta decisão do motorista, como constou das premissas fáticas incorporadas pelo acórdão Regional, ao manter a sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos, em procedimento sumaríssimo.”. Veja a decisão aqui.


E a 5ª Turma, no processo TST-RR-1000123-89.2017.5.02.0038:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. VÍNCULO DE EMPREGO. MOTORISTA. UBER. AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. Em razão de provável caracterização de ofensa ao art. 3º, da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o prosseguimento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. VÍNCULO DE EMPREGO. MOTORISTA. UBER. AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Destaque-se, de início, que o reexame do caso não demanda o revolvimento de fatos e provas dos autos, isso porque a transcrição do depoimento pessoal do autor no acórdão recorrido contempla elemento fático hábil ao reconhecimento da confissão quanto à autonomia na prestação de serviços. Com efeito, o reclamante admite expressamente a possibilidade de ficar “off line”, sem delimitação de tempo, circunstância que indica a ausência completa e voluntária da prestação dos serviços em exame, que só ocorre em ambiente virtual. Tal fato traduz, na prática, a ampla flexibilidade do autor em determinar sua rotina, seus horários de trabalho, locais que deseja atuar e quantidade de clientes que pretende atender por dia. Tal auto-determinação é incompatível com o reconhecimento da relação de emprego, que tem como pressuposto básico a subordinação, elemento no qual se funda a distinção com o trabalho autônomo. Não bastasse a confissão do reclamante quanto à autonomia para o desempenho de suas atividades, é fato incontroverso nos autos que o reclamante aderiu aos serviços de intermediação digital prestados pela reclamada, utilizando-se de aplicativo que oferece interface entre motoristas previamente cadastrados e usuários dos serviços. (...)”. Veja a decisão aqui.

 

Considerações do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira.

A popularização dos aplicativos é uma realidade, e tanto quanto possível empreendedores digitais buscarão as facilidades de ganho, em alguns casos transferindo os riscos do empreendimento para os usuários do app.

Há quem equipare a plataforma “Mercado Livre” aos serviços do “Uber”. Parece que há uma clara diferença, porque uma plataforma equipare-se a um “shopping virtual” cuja loja pertence ao vendedor. Já os motoristas de app prestam um serviço em nome da Uber, por exemplo.

Evidentemente, que no caso de motoristas de aplicativo, realmente, a configuração da relação de emprego parece ser mais difícil, em razão da extrema liberdade possível a alguns. O vínculo somente poderia vir a ser realmente configurado em caso de uma constante e diária prestação de serviços... Por exemplo: um motorista que trabalhe meses seguidos com o aplicativo, em uma jornada superior a seis (06) horas diárias.

Outra situação em que o vínculo se apresenta com muito mais facilidade é dos “motoboys” das plataformas de entregas de comida ou encomendas.

De qualquer forma, os elementos configuradores da relação de emprego estão previstos nos art. 2º, 3º e 4º da CLT:

 Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

(...)

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

(...)

Art. 4º - Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada.


[1] https://www.conjur.com.br/2020-dez-02/relator-processo-tst-defende-vinculo-entre-motorista-uber