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sexta-feira, 10 de junho de 2011

O advogado e a sua devoção a uma causa.

"O advogado que garantiu a liberdade de Battisti
Dia 8 de junho de 2011. Às 22h, na parte de trás do prédio que abriga o plenário do Supremo Tribunal Federal, o advogado Luís Roberto Barroso sacode vagarosamente uma cópia do alvará de soltura de Cesare Battisti que lhe chegou às mãos, com um sorriso que não lhe cabia no rosto, e pergunta, para si mesmo, e para os advogados de sua equipe que o cercam: E agora? Como se tira uma pessoa da cadeia?. Certamente, um problema bem menos angustiante do que a equipe enfrentou nos últimos meses.

A vida do advogado às vezes parece uma montanha russa. O trabalho de equipe é fundamental, mas as principais decisões são solitárias. Todo profissional é familiarizado com frustrações e os mais experientes sabem o quanto é importante dosar a emoção na hora da vitória. O caso que Barroso acaba de enfrentar, contudo, permite a exceção.

Seis horas antes, Barroso ocupara a tribuna do Supremo em defesa da liberdade do italiano, ex-integrante de grupos de extrema esquerda nos anos 1970 na Itália, preso há quatro anos no Brasil por conta de pedido de extradição feito pelo governo daquele país. Pela primeira vez, tinha subido nervoso à tribuna que ocupa com frequência.

'Raramente me exalto e dificilmente fico nervoso. Este foi um dos poucos dias da minha vida que me senti como um corredor de Fórmula 1, que chega à última volta com chances de ganhar, mas morrendo de medo de bater. Era essa a sensação', afirmou o advogado à revista Consultor Jurídico. Barroso ganhou a corrida, sem cobrar um centavo pelo trabalho. Foi a estrela do processo. Sem seu empenho, provavelmente Battisti estaria, a esta altura, num avião com destino à Itália.


A defesa do caso Battisti foi um ponto fora da curva na carreira de Luís Roberto Barroso. O advogado nunca havia trabalhado em um processo que envolve questões criminais e não deve voltar a fazê-lo. 'Embora tenha sido uma experiência pessoal, humana e profissional extraordinária, eu acho que este caso basta', afirmou. Daí sua dúvida sobre o procedimento diante do alvará de soltura.

Habituado a lidar com teses judiciais abstratas, em que não é necessário olhar nos olhos dos milhares de pessoas que são afetadas pelas decisões, o advogado teve de mudar sua rotina e se preparar para a batalha em um terreno ainda desconhecido por ele. Não era o primeiro caso polêmico que assumia no Supremo, mas era uma novidade sob todos os ângulos.

O advogado atuou no processo que se transformou na Súmula Vinculante que vedou o nepotismo nos três poderes da República, participou como amicus curiae da ação que legitimou as pesquisas com células-tronco embrionárias e liderou a ação na qual o tribunal equiparou a união homoafetiva à união estável entre casais convencionais. Saiu vitorioso em todos os casos. Está à frente, também, da ação que pede que as gestantes possam interromper a gravidez em casos de fetos anencéfalos.

Nada foi tão avassalador em termos pessoais quanto a defesa de Battisti: 'A intensidade das paixões que ele mobilizou eu não sou capaz de identificar a origem. Nem a discussão da anencefalia ou do nepotismo, em que muita gente foi afetada, causou tamanha reação. Esse foi o único caso em que eu recebi muitos insultos, e-mails e mensagens de pessoas dizendo coisas horrorosas'.

O que não quer dizer que se arrependa. 'Não tive qualquer dúvida. Tive alguns sofrimentos pessoais, porque, muitas vezes, as pessoas se convencem tanto de suas próprias razões que acham que não precisam se comportar bem. Mas faria tudo novamente', garante.

Luís Roberto Barroso nunca havia colocado os pés em um presídio, mas passou a ir ao Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, com regularidade. 'Nas primeiras vezes, não sabia nem como me comportar. Visitava o Cesare pelo menos uma vez por mês. Às vezes, duas.' Para um advogado que vivia em um mundo mais de ideias do que de gente, foi um show de vida real.

Em 13 de abril de 2009, pouco mais de dois anos antes de conseguir a liberdade do italiano, o advogado assumiu sua defesa ao lado do colega Luiz Eduardo Greenhalgh. Na nota em que anunciou a entrada no processo de extradição que tramitou no Supremo, Barroso afirmou que 'viola as tradições jurídicas e humanitárias brasileiras o encarceramento perpétuo de uma pessoa não perigosa e de longa data ressocializada, tendo se passado mais de 30 anos dos episódios que deram causa à condenação criminal'.

Começava aí seu trabalho, que terminou na madrugada de quinta-feira (9/6) quando entregou a Cesare Battisti, na Papuda, seu alvará de soltura. Agora, o caso de Battisti está de volta às mãos de Greenhalgh.

Causa bonita
Barroso assumiu a defesa de Cesare Battisti a pedido da escritora francesa Fred Vargas. No começo de 2009, o advogado recebeu uma ligação da escritora que lhe contou o caso e pediu sua intervenção. O pedido foi feito pouco depois de o então ministro da Justiça, Tarso Genro, ter concedido refúgio ao italiano, em janeiro daquele ano. Na ocasião, se vislumbrava um longo caminho a ser percorrido. O ministro Cezar Peluso, relator da ação, já havia sinalizado não ser simpático à causa de Battisti.

A primeira condição de Barroso foi que sua entrada no processo tivesse a concordância de Greenhalgh, o colega que, até ali, cuidava sozinho da ação. Tratava-se de uma questão ética. 'Um advogado não entra na causa de outro, salvo por pedido ou convite do próprio advogado. Ou quando ele é destituído, o que não era o caso.'

Depois da ligação de Greenhalgh o convidando para atuar, recebeu o substabelecimento e foi estudar os 18 volumes da ação, que continha todos os detalhes dos processos em que Battisti foi condenado por quatro homicídios entre os anos de 1977 e 1979.


Sua equipe fez a leitura de todas as peças e uma seleção do que achava relevante que o próprio Barroso estudasse. 'Quando acabei de ler o processo, já não tinha nenhuma dúvida de que lado eu queria estar nessa briga. Teria de defender o Cesare', disse. Barroso se convenceu que as ações contra Battisti não seguiram o devido processo legal e que seu direito à ampla defesa fora desrespeitado.

O primeiro obstáculo foi vencer a desconfiança dos próprios familiares. Ouviu do pai, da sogra, da mulher e dos amigos próximos a mesma pergunta: 'Por que você aceitou esse caso?'. Não foi diferente com seus clientes: 'Barroso, um velho comunista?'. As explicações iniciais foram uma preparação singela perto do que viria mais à frente.

'O senso comum é todo o contra o Cesare porque é pragmático. O senso comum questiona por que o Brasil tem de se indispor com a Itália para defender um sujeito não tem nada a ver com o país. Não quer saber se é um cidadão que teve direitos fundamentais desrespeitados. Como disse, é pragmático', opina Barroso.

Por que, então, embarcar nessa aventura? 'A causa era bonita', justifica. O advogado viu beleza no fato de defender 'um velho comunista, que faz parte do lado derrotado da história, e que a Itália, 30 anos depois, veio perseguir no Brasil'. Acima de tudo, Barroso acreditou em Battisti. "O Cesare me olha nos olhos e diz: 'Não participei de nenhum desses homicídios'. Eu acredito no que ele me diz. Mas, independentemente da minha certeza subjetiva, a leitura do processo traz muitas dúvidas objetivas', explica.

Para abraçar a causa, Barroso somou a crença nas palavras do italiano às falhas dos processos que geraram sua condenação na Itália. De acordo com o advogado, não havia provas suficientes para embasar as condenações pelos homicídios.

'Não havia armas apreendidas, perícias, nada. Apenas testemunhos que se contradiziam. Cesare foi levado a julgamento junto com outros membros dos PAC (Proletários Armados pelo Comunismo) e não foi sequer acusado de cometer os assassinatos. Foi condenado por subversão. Depois, quando ele já estava na França, um dos líderes do grupo, Pietro Mutti, acusado pelos homicídios, colocou a culpa em Cesare e foi beneficiado pela delação premiada', conta Barroso.

E completa: 'Julgado pela segunda vez à revelia, dez anos depois, com a defesa feita por um advogado que nunca falou com ele e que foi constituído pelos membros do grupo que estavam se livrando graças à delação, foi condenado', afirma Barroso. O advogado cita as mesmas contradições nos processos italianos que o próprio Battisti apontou em entrevista exclusiva concedida à ConJur antes do julgamento pelo Supremo. Esses foram os fatos que o convenceram, aliados à palavra de seu mais famoso cliente.

Como todo bom advogado sabe, quando o juiz começa seu voto elogiando a sustentação oral, é porque votará contra os interesses do advogado. Ao falar da Itália, Barroso usa do mesmo expediente. Frisa que respeita o país e suas instituições, para, então, fazer as ressalvas. Como crer que na Itália, uma pujante democracia já naquela época, não foi respeitado o devido processo legal? 'Provavelmente, a democracia italiana era mais truculenta do que a ditadura brasileira', justifica.

Estratégia de defesa
Convencido de que a causa era justa e valia à pena, Barroso passou a estudar sua estratégia, bolar as teses e se debruçar sobre a jurisprudência do STF que dizia respeito ao tema. Foram vários brainstorms e conference calls com suas equipes dos escritórios do Rio de Janeiro e de Brasília.

A primeira tese, que inicialmente aparentava ser a mais segura, estava à mão: quando o governo concede refúgio a um preso, o processo de extradição contra ele é arquivado pelo Supremo. Três anos antes de o advogado assumir a causa, a Corte tinha decidido exatamente isso no processo do colombiano Padre Medina, integrante das Farc, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia.

O advogado iniciou o périplo pelos gabinetes dos ministros do Supremo, como é praxe. Foi recebido pessoalmente por sete dos nove ministros que votaram no caso — nos gabinetes de Ellen Gracie e Gilmar Mendes foi atendido por assessores. 'Muito bem atendido', ressaltou. Entregou memoriais e defendeu suas razões.

Nos encontros, percebeu, mesmo antes do julgamento, que a tese de que o refúgio faz arquivar o processo de extradição corria riscos. 'Não faço prognósticos. Mas, evidentemente, faço uma contabilidade íntima. Como os ministros não dão pistas, você passar a fazer leitura corporal, facial, e com base no que conhece da Corte, faz suas apostas.'

Barroso tinha para si que o placar, contrário ou favorável, seria apertado. Isso fez com que lançasse mão de outros argumentos técnicos que, na sua avaliação, davam conforto jurídico à defesa. O prazo de prescrição dos crimes, a anistia brasileira e as razões ponderáveis do refúgio eram três deles.

O advogado tinha ciência de que a discussão sobre o caráter político dos crimes seria polêmica. 'Não é uma questão banal a qualificação do que seja um crime político, mas a qualificação do que seja devido processo legal é razoavelmente simples', sustenta. E este foi outro ponto técnico que usou em sua defesa. Consistia em demonstrar que seu cliente foi julgado uma segunda vez, com base em delação premiada dos membros do PAC e defendido por um advogado indicado pela organização. 'Em qualquer lugar do mundo se acenderia uma luz amarela, de que ali não houve devido processo legal.'

O receio de Barroso se confirmou e sua primeira tese foi derrubada pelo Supremo em novembro de 2009. Por cinco votos a quatro, os ministros decidiram que o ato de refúgio do ministro da Justiça é sujeito ao controle judicial. Em consequência, acolheram o pedido de extradição do governo italiano. O advogado insistia — e ainda insiste — que se trata de um ato político, discricionário: 'Com o respeito devido e merecido, o Supremo errou'.
Barroso ressalva que mesmo o ato político tem de ser plausível. Ou seja, se o ministro da Justiça concede refúgio a um estrangeiro com o argumento de que seres de Marte invadiram o Brasil e tentaram abduzi-lo, o ato pode ser anulado. Por motivos óbvios. 'Mas o ato embasado no fato de que, no clima que vivia a Itália no início da década de 1980, não era possível assegurar as garantias de um acusado de extrema esquerda ao devido processo legal, é bastante plausível', diz o advogado ao defender o ato do atual governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro.

A virada
A possibilidade, que veio a se confirmar, de perder na discussão sobre a tese de que o refúgio não poderia ser anulado pelo Supremo, fez com que Luís Roberto Barroso, antes do julgamento, se dedicasse a uma nova frente de batalha. O advogado trabalhou para manter a jurisprudência da Corte de que a última palavra em extradição é do presidente da República.

Havia o receio de que o tribunal mudaria sua posição tradicional também nesse quesito. Assim, no julgamento de 2009, eram duas as preocupações da defesa. Não perder por um placar muito elástico na extradição e resguardar a competência do presidente da República para que ele pudesse ratificar, com base em outros fundamentos, a posição do ministro Tarso Genro.

Nesse ponto, Barroso venceu. Pelo mesmo placar de cinco a quatro, o STF manteve a competência presidencial e abriu o caminho para a vitória final do advogado na última quarta-feira (8/6). Um placar elástico pela nulidade do refúgio e em favor da extradição colocaria o presidente em uma situação politicamente difícil para negar a entrega de Battisti diante do Supremo.

Efetivamente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mudou seus fundamentos ao decidir não entregar Battisti para a Itália. Tarso fundou sua decisão do refúgio na falta de devido processo legal na Justiça italiana. Lula se baseou na animosidade demonstrada pelos italianos em relação a Battisti.

O êxito se deveu também à mudança de foco da defesa no curso do processo. Quando Barroso sentiu que não seria capaz de mudar a percepção pública sobre Battisti, partiu para a batalha em torno da autonomia do chefe de Estado para conduzir suas relações internacionais. Nesta autonomia, incluem-se decisões sobre extradição.

'As pessoas já tinham a sua opinião formada e nós não tínhamos espaço na imprensa para reconstruir a imagem do Cesare. A tal ponto que quando saiu o parecer do procurador-geral da República da época, Antonio Fernando de Souza, segundo o qual a concessão de refúgio extinguia o processo de extradição, nós não conseguimos que isso fosse noticiado em nenhum órgão da grande imprensa', lembra Barroso.

Mais do que isso. O advogado explicou para mais de um jornalista importante que tratar Battisti como terrorista era incorreto pelo fato de que ele nunca havia sido acusado ou condenado por terrorismo nos processos italianos. Ouvia como resposta que o termo seria usado por conta da linha editorial do órgão. Barroso lamenta: 'Desculpe-me, mas isso não é uma questão de linha editorial. Isso é um fato. É ou não é. No caso, não é'.

De qualquer forma, depois de ganhar no quesito competência do presidente da República, o advogado foi a campo. Sem muitos contatos políticos, marcou audiências com autoridades do Planalto pelos meios convencionais e, exatamente como fez com os ministros do Supremo, defendeu suas convicções e entregou memoriais com sua versão e defesa do caso. Falou com o então chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, com o ministro da Justiça Luís Paulo Barreto e com o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams.

A tarefa não foi simples. Barroso teve como adversário Nabor Bulhões, um dos mais respeitados advogados do país, em defesa da Itália, além de dois ministros aposentados do Supremo Tribunal Federal: Carlos Velloso, que emitiu parecer em favor da extradição, e Francisco Rezek, que deu declarações públicas em apoio ao pleito italiano.

Depois da passagem pelos gabinetes, a defesa de Battisti, e o próprio, tiveram um longo período para exercitar a virtude da paciência. O trabalho estava feito e era necessário apenas esperar. Mais de um ano depois da primeira decisão do STF sobre o caso, no último dia de seu segundo mandato, em 31 de dezembro de 2010, o presidente Lula decidiu não entregar Battisti à Itália.

Luís Roberto Barroso logo entrou com pedido de liberdade no Supremo. Com o ato de Lula e a decisão da Corte que mantinha sua competência, a defesa alegou que restava apenas libertar Cesare Battisti. Não foi o que entendeu o presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso. A Corte ainda analisaria se o presidente havia cumprido os limites do tratado de extradição firmado entre Brasil e Itália.

O governo italiano também recorreu pedindo que Battisti não fosse solto até nova manifestação do STF e alegou que Lula havia descumprido a decisão do tribunal. Ganhou a primeira e perdeu a segunda.

Battisti ficou preso até o novo julgamento, na última quarta-feira, cinco meses depois do ato de Lula. Mas os ministros decidiram, por seis votos a três, que é legal o ato do ex-presidente, que negou a extradição de Battisti pedida pelo governo da Itália. Mais: que o governo italiano sequer poderia ter contestado o ato, por uma questão de soberania nacional. Ou seja, um Estado estrangeiro não pode contestar, no Supremo, um ato do chefe do Poder Executivo brasileiro na condução da política internacional.

O Supremo também fixou que, depois que a Corte determina a extradição, a decisão de entregar ou não o cidadão que o Estado estrangeiro pede ao Brasil é discricionária. Ou seja, cabe apenas ao presidente da República decidir e o Judiciário não pode rever a decisão. Exatamente a tese que Barroso abraçou logo após perder o debate sobre o refúgio.

Para o bem da verdade, Barroso teve um bom reforço em seu trabalho. Os dois pareceres da Procuradoria-Geral da República que vieram ao encontro de sua tese e os quatro advogados de sua equipe que se dedicaram com afinco ao caso, principalmente no último semestre, por conta de sua estadia na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, como professor visitante. Em seu blog, o advogado faz referência aos profissionais: Eduardo Mendonça, Renata Saraiva e Carmen Tiburcio, que trabalharam sob a coordenação de Ana Paula de Barcellos.

Contato pessoal
Paralelamente à batalha jurídica, coube a Barroso também o papel de conselheiro de Cesare Battisti. Depois de conversar com o italiano pela primeira vez e aceitar defendê-lo, sua orientação inicial foi que ele parasse de escrever cartas para as mais variadas pessoas, como sempre fazia. Também pediu que não concedesse entrevistas.

A ideia era fazer uma defesa técnica e evitar discussões pela imprensa. A parte das entrevistas foi simples de cumprir. O difícil para Battisti, preso, era parar de escrever as cartas. Barroso sugeriu: 'Continue a escrever, mas mande as cartas para mim'. Foi o que ele fez. Com isso, o advogado guarda uma rica e histórica correspondência.

No final de 2009, quando Battisti decidiu fazer greve de fome, Luís Roberto Barroso foi até a Papuda tentar demovê-lo da ideia. Foi franco. 'Não posso viver sua vida e tenho de respeitar suas decisões, mas se você tivesse me perguntado, teria dito que não deveria fazer isso', disse-lhe o advogado.

Dias depois, o presidente Lula declarou que não se sentia pressionado pela greve de fome. Barroso voltou ao presídio. 'Cesare, a única pessoa que pode decidir seu destino não se comoverá com essa greve de fome. Pense bem antes de continuar com isso', aconselhou.

O advogado recebeu, depois, a notícia de que Battisti havia encerrado seu protesto. Para se certificar, foi até a Papuda com uma caixa de biscoitos caseiros, feitos por sua sogra. Perguntou se ele tinha, de fato, encerrado a greve de fome. Ao receber a resposta afirmativa, Barroso emendou, para se certificar da decisão: 'Então, prove um desses biscoitos.' Battisti provou.

Os dois últimos conselhos de Barroso a Battisti foram dados já na madrugada de quinta-feira (9/6), pouco antes de o italiano deixar o presídio de carro junto com Luiz Eduardo Greenhalgh. Primeiro, pediu que ele espere um pouco antes de dar entrevistas, que se recomponha, retome sua vida, reveja sua família e, só então, fale. Segundo, que não critique qualquer das decisões do Supremo Tribunal Federal sobre o seu caso. 'Olhe para frente e não cultive ressentimentos.'

Barroso faz questão de destacar que nutre grande respeito e admiração por todos os ministros do Supremo, inclusive por Cezar Peluso, Ellen Gracie e Gilmar Mendes, que votaram contra suas teses. 'Mesmo quando me vi no dever de criticar o presidente do Supremo porque ele decidiu não libertar o Cesare, fiz a contragosto, porque achei que ele acabou por fazer prevalecer sua posição, que era vencida no julgamento. Mas, às vezes, as pessoas estão em lados opostos', disse.

Apesar da obsessão por procurar limitar seus argumentos ao campo técnico-jurídico em suas ações, Barroso confessa que escolhe as boas causas também com o coração: 'Hoje, mais do que quando eu era mais jovem e a vida mais difícil, posso escolher com algum conforto de que lado eu quero estar'.

Para ele, o advogado não deve fazer juízos morais. Se o profissional se comporta eticamente e dentro da lei, não importa qual é a acusação contra o seu cliente. Mas, como qualquer pessoa, pode fazer juízos políticos internos para escolher seu campo de batalha.

Se no lugar de Cesare Battisti estivesse um agente das ditaduras latino-americanas acusado de tortura, nas mesmas condições, com o argumento de que foi condenado sem o devido processo legal, o advogado Luís Roberto Barroso o defenderia? 'Acho que meu coração não bateria por ele. O que não significa que o direito dele não fosse necessariamente um bom direito. Mas gosto muito de uma frase do Julio Cortázar: 'Eu sei onde tenho o coração e por quem ele bate'."

Fonte: Conjur (http://www.conjur.com.br/2011-jun-10/barroso-advogado-garantiu-liberdade-cesare-battisti), acessado em 10/06/2011.
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STF pode garantir reajustes anuais ao funcionalismo.

O STF iniciou nesta quinta (9) o julgamento de uma ação que pode resultar na garantia de reajustes anuais para servidores federais, estaduais e municipais.

Relator do processo, o ministro Marco Aurélio Mello reconheceu o direito do funcionalismo à reposição das perdas impostas pela inflação.
Disse que a correção monetária anual dos contracheques dos servidores públicos está prevista no inciso 10o do artigo 37 da Constituição.

A despeito disso, realçou o ministro, estabeleceu-se um 'círculo vicioso' nas esferas 'federal, estadual e municipal'.

No dizer do ministro, os governantes mantêm 'os olhos fechados' para o texto constitucional, descumprindo-o.

A ação é movida por servidores públicos de São Paulo. Está submetida, porém, ao princípio da 'repercussão geral'.
Significa dizer que a decisão do Supremo valerá para todos os servidores do país, inclusive os do Poder Judiciário. Coisa de 10 milhões de pessoas.
O julgamento não foi concluído porque a ministra Cármen Lucia, primeira a se pronunciar depois da leitura do voto do relator, pediu vista dos autos.

Os servidores de São Paulo, Estado governado pelo PSDB há 16 anos, reivindicam no STF uma indenização pelos reajustes que não receberam nos últimos anos.

Marco Aurélio não se limitou a deferir o pedido. Decidiu que a indenização terá de ser paga com juros e correção monetária.

Para ele, ao sonegar ao funcionalismo a reposição dos indices de inflação, o Poder Público aufere 'vantagem indevida'.
Algo que, diante do poderio do Estado, aproxima-se do 'facismo'. O ministro acrescentou:
'Não se pode adotar entendimento que implique supremacia absoluta do Estado, em conflito com o regime democrático e republicano'.

O Judiciário não tem poderes para obrigar União, Estados e municípios a conceder reajustes salariais. Porém, o ministro fez uma distinção entre reajuste e reposição inflacionária.
'Correção monetária não é acréscimo, não é ganho, é mera reposição com o escopo de preservar o valor' do salário, disse ele.

Marco Aurélio serviu-se de emenda aprovada sob FHC para justificar a concessão do pedido feito pelos servidores do Estado governado pelo tucano Geraldo Alckmin.
Lembrou que a redação do inciso 10 do artigo 37 da Constituição, que prevê os reajustes anuais, foi fixada por uma reforma administrativa de 1998.

O ministro reproduziu trecho da justificativa enviada ao Legislativo por Clóvis Carvalho, à época o chefe da Casa Civil de Fernando Henrique Cardoso.
O auxiliar de FHC escreveu que os objetivos da reforma eram: 'recuperar o respeito e a imagem do servidor público perante a sociedade; estimular o desenvolvimento profissional dos servidores e; por fim, melhorar as condições de trabalho'.

E Marco Aurélio: 'Vê-se, então, que a reforma administrativa veio para melhorar as condições do servidor'. Daí a sua interpretação do texto constitucional.

O julgamento será retomado quando Cármen Lucia devolver o processo ao plenário do Supremo. Não há, por ora, data prevista."

Fonte: Folha.com

** Comentários do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira
Já havíamos nos expressado a respeito do assunto em maio passado. Confira o link para http://efoadvogado.blogspot.com/2011/05/justica-reconhece-o-direito-de.html.

Realmente, há o direito. E se o direito é desrespeitado por ação ou omissão, o Estado deve indenizar. Veja, indenizar, ou seja, pagar aos servidores o montante correspodente aos valores que não foram incorporados aos vencimentos. Todavia, tais valores não se confundem com a reposição a ser creditada em holerite. São somente indenizações, valores compensatórios do não reajustamento dos salários.
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Eliminado por meio ponto consegue aprovação.

"Um candidato eliminado de concurso público para o cargo de analista financeiro do Tesouro estadual em Santa Catarina por meio ponto na prova de redação teve reconhecido o direito de ser aprovado um ano após a homologação do resultado final do exame. A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou a nulidade da correção, mas atendeu ao pedido alternativo do candidato para aprová-lo com a pontuação mínima necessária, de modo a não interferir na eventual posse e exercício dos demais aprovados.

Para o relator, ministro Mauro Campbell Marques, a banca adotou critérios muito amplos para a correção, que não permitiriam qualquer tipo de controle pelos candidatos. O edital afirmava apenas que 'Os textos dissertativos produzidos pelos candidatos serão considerados nos planos do conteúdo e da expressão escrito, quanto à (ao): a) adequação ao tema propostos; b) modalidade escrita na variedade padrão; c) vocabulário; d) coerência e coesão; e) nível de informação e de argumentação'.

Segundo o ministro, a norma não indica o peso ou faixa de valores de cada quesito, o verdadeiro conteúdo de cada um deles nem o valor de cada erro. 'Mas a situação fica pior quando se tem contato com a folha de redação do candidato, da qual não consta nenhuma anotação - salvo o apontamento de erros de português - apta a embasar o resultado final por ele obtido na referida prova. Enfim, tem-se, aqui, ato administrativo sem motivação idônea, daí porque inválido', acrescentou o ministro.

Dilema
O ministro afirmou que a ausência de motivação do ato administrativo constituído na correção da prova do candidato o torna nulo. Porém, o concurso foi homologado em junho de 2010, e não seria possível apenas determinar nova correção da prova. 'Deste jeito, a motivação existiria, mas seria posterior e prejudicaria todo o certame', ponderou.

Como o candidato foi eliminado por apenas meio ponto, e fez pedido alternativo de que lhe fosse conferida a nota mínima necessária para aprovação, o ministro Mauro Campbell avaliou que pequeno acréscimo sanaria a nulidade de forma mais proporcional em relação aos demais candidatos e ao concurso como um todo.

'Tendo em conta que já se passou quase um ano da homologação final do concurso, com eventual posse e exercícios dos demais candidatos aprovados, e observando que a nova ordem de classificação normalmente influi na lotação dos servidores, é caso de permitir a aprovação do candidato, mas consolidada na última colocação entre os aprovados, a fim de que a coisa julgada na presente ação não atinja terceiros que não participaram dos autos', concluiu o relator.

Pertinência temática
O ministro afastou, porém, o argumento do candidato de que a prova de redação teria cobrado conteúdo não previsto no edital. A prova tratou da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas o detalhamento do item correspondente a finanças e orçamento público não traria, de modo literal, a norma. Mas havia previsão de temas como receita e despesa pública, crédito, planejamento, orçamento e leis orçamentárias, que, conforme anotou o relator, são pontos regulados diretamente pela LRF.

Segundo o magistrado, o edital deve ser interpretado de acordo com a presunção de legitimidade dos atos administrativos. Por isso, só haveria ilegalidade se houvesse incompatibilidade absoluta entre a previsão do edital e o tema da redação. 'Ao contrário, sendo possível inferir do conteúdo da cláusula editalícia o tema proposto, dentro de suas possibilidades gramaticais, devem ser mantidos o edital e a posição da banca examinadora no ponto', concluiu. "

Processo: RMS 33825
Fonte: Superior Tribunal de Justiça

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Ministro Marco Aurélio Mello. Um dos grandes nomes do Judiciário. O grande nome do STF!

" 'Plenário Virtual não analisa Agravo nem mérito'
Para o ministro Marco Aurélio, a regra é clara: o Plenário Virtual só serve para a análise de repercussão geral (sem entrar no mérito da discussão) de Recurso Extraordinário. Agravos, na opinião do ministro, não devem ser analisados por meio de julgamentos virtuais. Em seu pronunciamento no Agravo de Instrumento 841.548, levado ao Plenário Virtual pelo presidente Peluso, Marco Aurélio expôs o seu entendimento.

'Inicialmente, consigno a erronia de lançar, no Plenário Virtual, o Agravo de Instrumento', escreveu. Esta foi a segunda vez que o ministro reclama do julgamento virtual de agravos.

Neste caso, entretanto, o ministro Cezar Peluso colocou o Agravo na pauta, mas, em seu pronunciamento, deu provimento e o converteu em Recurso Extraordinário. Em seguida, o presidente cita a jurisprudência da corte sobre a matéria em discussão e conclui: 'Ante o exposto, reafirmo a jurisprudência da corte para negar provimento ao Recurso Extraordinário'.

O ministro Marco Aurélio questiona mais uma vez a decisão do presidente. Para ele, o ministro Cezar Peluso entrou no mérito da discussão e deixou de analisar a sua repercussão geral, o que não pode acontecer no Plenário Virtual. 'Quanto à apreciação do mérito do extraordinário no Plenário Virtual, relembro que o sistema excepciona a regra relativa à necessidade de o colegiado reunir-se. Os ministros atuam sem a indispensável discussão da matéria e troca de ideias.'

O Plenário Virtual surgiu com a função de ser uma ferramenta dinâmica para filtrar a chegada de recursos ao Supremo, a primeira etapa para chegar ao Plenário real. Ou para ser descartado, quando o tema só interessa às partes envolvidas.

Privada ou Estatal?

A Paranaprevidência pede, por meio do Agravo convertido em RE pelo presidente Peluso, para que fosse considerada empresa pública, assim poderia pagar as dívidas por meio de precatórios.

De acordo com o recurso, a Paranaprevidência é gestora de receitas previdenciárias vinculadas a fundos criados para o pagamento de aposentadoria e pensões de servidores públicos do Paraná, o que demonstraria sua finalidade “indiscutivelmente pública”.

Para reforçar a sua tese, cita julgamento do Supremo (RE 220.906) que aplicou este entendimento ao caso dos Correios.

No seu pronunciamento no Plenário Virtual, o ministro Cezar Peluso cita diversos julgamento sobre a matéria e afirma que corte 'possui jurisprudência firmado no sentido de que as entidades paraestatais que possuem personalidade de pessoa jurídica de direito privado não fazem jus aos privilégios processuais concedidos à Fazenda Pública'.
Agravo de Instrumento 841.548"

Fonte: Por Camila Ribeiro de Mendonça, para o Conjur (http://www.conjur.com.br/2011-jun-09/marco-aurelio-plenario-virtual-nao-analisa-agravo-nem-merito) acessado em 09/06/2011.

**  Comentários do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira
O Ministro Marco Aurélio Mello é, na nossa modesta opinião, o grande nome do STF. Audacioso, não tem medo do embate lúcido. É forte e profundo em seus argumentos. Possui um raciocínio jurídico excepcional, sendo fiel somente às suas convicções e valores. Não se deixa intimidar por discursos de autoridade (mesmo porque é uma das mais altas autoridades brasileiras), nem é seduzido pela polidez interesseira. Juiz de carreira, oriundo da Justiça Trabalhista, é quase sempre voto vencido nos julgamentos. Mas os seus argumentos permanecem fortes nas mentes daqueles que acompanham os seus votos.

O caso diz respeito à reunião dos Ministros. Plenário é o encontro dos onze juízes do STF, ou seja, o STF completo para apreciar e julgar os processos que a ele são submetidos. Normalmente, as reuniões do Plenário ocorrem com a presença de todos os Ministros, e os julgamentos são televisionados pela TV Justiça. Causas importantíssimas foram decididas dessa forma: a questão das pesquisas com as células-tronco, a validade da Lei de Imprensa, a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, a extradição de Cesare Battisti. É no plenário que há, também, os verdadeiros embates jurídicos. Advogados dos mais renomados e Juristas de ponta discutem, com profundidade, o destino de pessoas.

E o que é o Plenário Virtual? A reunião via computador....De forma jocosa, um "chat jurídico"....Deveria ser utilizado somente para triar os processos que seriam encaminhados ao Plenário real para nele, Plenário real, ser julgados. Lamentavelmente, mais uma investida do autor da PEC dos Recursos (PEC que visa impedir os processos de chegarem no STF) e que pretendia julgar por "chat" processos importantes.

E a publicidade das sessões de julgamentos? Está garantida no artigo 93, inciso X, da CF/88. Será que nesse caso era só pedir para "add"?

Dessa vez, o Ministro do voto vencido pôs o dedo na ferida. Sorte a dos jurisdicionados.

Lei da Entrega: o outro lado da moeda. A visão das empresas.

"Lei da entrega aumenta custo e prejudica consumidor

Entrou em vigor no estado de São Paulo, em 7 de outubro de 2009, a Lei 13.747/09, oriunda do Projeto de Lei 298/2008, conhecida como a Lei da Entrega. A Lei obriga os fornecedores de bens e serviços localizados no estado de São Paulo a fixarem data e turno para realização dos serviços ou entrega dos produtos aos consumidores.

Aludido excerto normativo tem especial peculiaridade ao estatuir, de plano, que as obrigações decorrentes de suas normas entraram em vigor na data de sua publicação. Ou seja, não instituindo, assim, qualquer prazo para a adaptação dos fornecedores ao texto legal.

Aflora disso que a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo decretou e o Governador do Estado promulgou norma de grande impacto social. Foi estipulada onerosa obrigação aos prestadores de serviços, sem ao menos conceder qualquer vacatio legis para sua adequação, indo, assim, em total afronta à Lei Complementar 95/98, que brilhantemente dita que a lei deve contemplar prazo razoável para que dela se tenha conhecimento e se cumpra.

Tamanha aberração legislativa, que absurdamente impôs aos fornecedores e fabricantes obrigação automática de revisarem seus contratos de fornecimento, frutos de delongadas tratativas, acarretou grande instabilidade nas relações contratuais, bem como massivo investimento em novas tecnologias. Mais que isso, além da total falta de razoabilidade na aprovação da lei, há noticias de empresas que foram autuadas em menos de dois meses da publicação da norma. Decorre disso, que não há de prevalecer autuações da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor em tão curto espaço de tempo, visto terem fulgente finalidade arrecadatória, não observando, assim, qualquer caráter sócio-educativo da multa imposta.

A ausência de vacatio legis em normas de grande repercussão constitui uma violação e um retrocesso na dinâmica do devido processo legal, o qual impõe limite ao Poder Legislativo de apenas elaborar leis justas, dotadas de razoabilidade e racionalidade.

Suscitada medida, além de impor uma obrigação impossível de ser realizada em tão curto espaço de tempo, traduz-se em nítida intervenção ao princípio da liberdade contratual e ao princípio da livre iniciativa, visto que se vislumbra na presente situação evidente ingerência do Estado na atividade econômica.

A modificação imposta pela Lei de Entrega implica numa mudança em toda a cadeia de fornecimento. Alterações voltadas ao sistema de logística, estoque, fornecimento e condições comerciais, posto que deve ser implantada uma nova sistemática de comunicação entre mercadorias do estoque, prazo de entrega dos produtos dos fabricantes, bem como uma sincronização com as empresas que realizam serviços de entrega do produto.

Especificamente em relação a esse ponto, é importante destacar que a adequação imediata, sem o devido planejamento logístico, implica em um aumento significativo no custo da operação como um todo. Haverá necessidade, em tese, de uma nova implantação de novas tecnologias de comunicação, bem como revisão dos contratos com os fabricantes e prestadores de serviços de entrega, além das empresas terem que fornecer o devido treinamento para seus funcionários.

Diante disso, a jurisprudência tem considerado como abusiva qualquer autuação realizada pela Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon) antes do prazo de seis meses da vigência da norma.

Tantas modificações no sistema de prestação de serviços encarecem radicalmente o importe das operações. E, evidentemente, deverá ser repassado aos consumidores, acarretando, dessa forma, aumento do custo dos produtos e serviços prestados pelos fornecedores de bens e serviços localizados no estado de São Paulo. Decorre disso, que as empresas situadas neste Estado evidentemente estarão em patamares de desvantagem comercial em face dos fornecedores dos demais Estados, acarretando ofensa ao princípio da livre concorrência, previsto no inciso IV do artigo 170 da Constituição Federal.

Vale registrar que desnecessária foi a edição de Lei de Entrega, visto que a própria concorrência acarretaria uma maior e melhor precisão nos serviços prestados, diante da busca por novos mercados de consumo. Salienta-se, também, que o fornecimento da data e do turno de entrega do produto facilitará muito mais o trabalho das quadrilhas organizadas, visto que estas terão acesso ao turno e local no qual os caminhões de entrega estarão.

Com efeito, a forma como o Estado de São Paulo está impondo aludida regra ocasiona enorme desvantagem aos investidores desse Estado, além do fato de que grande parte das empresas estabelecidas na região não está preparada para atender às exigências ditadas pela Lei de Entrega.

Portanto, os amenos benefícios estatuídos pela norma aos consumidores acarretarão graves consequências aos investimentos realizados em São Paulo, pois além dos inúmeros benefícios fiscais concedidos pelos demais Estados da Federação, as empresas encontram diversos outros empecilhos legislativos como o presente, afastando, assim, grandes investimentos e lucros para este estado."

Por Diogo Verdi Roveri e Viviane Granda, advogados de Peixoto e Cury Advogados, firma especializada na defesa de fornecedores.

** Comentários do Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira
A Lei da Entrega não vem sendo cumprida em São Paulo. Ademais, conta-se ainda com a omissão do Procon, que não reconhece ilegalidade na cobrança pelo agendamento da entrega. Segundo o órgão, o ilegal é não haver a opção pelo agendamento da entrega, sendo possível a cobrança pela entrega agendada.
Os argumentos expostos não convencem, exceto quanto à eventual necessidade de concessão de prazo para a adptação das empresas às novas exigências. Mas se isso poderia ser invocado lá atrás, quando a lei foi sancionada (em 07/10/2009) isso já não é mais defensável. Passados mais de um ano da vigência da lei, soa absurda a alegação de prazo razoável para a adequação das empresas.
Além disso, a situação relatada somente confirma o que já dissemos em ofício encaminhado ao Procon/SP acerca do descumprimento da "Lei da Entrega". Isto é: as despesas com as entregas são direta e indiretamente suportadas pelos consumidores, que não podem ficar à mercê de fornecedores e empresas de logística, que recebem pelo serviço.
A invocação da concorrência desleal também não convece. A lei vale para todos os que atuam para os consumidores paulistas.
A natural acomodação do mercado é outra falácia em tempos de capitalismo globalizado. Quando o "Submarino.com" era concorrente de fato, havia equilíbrio. Hoje, Shop Time, Submarino e Amaricanas.com fazem parte do conglomerado "B2W", ou seja, que concorrência existe? Nem uma!
Some-se a isso o fato de que as regras do ICMS exigem que as empresas sediadas em outros estados paguem o imposto também em São Paulo. O resultado é que além da ineficiência logística, as empresas também não recolhem os tributos devidos para o estado de São Paulo.
A consequência é que o consumidor paga, mas nunca lhe entregam.
Não fossem os abusos cometidos, não haveria a necessidade de legislar.
É certo que a lei contém algumas falhas, mas isso seria perfeitamente contornável desde que houvesse empenho das autoridades.
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