Tempo à disposição do "patrão" é cosiderado como jornada de trabalho
Horas extras e as formas de impedir o pagamento são questionadas na Justiça
VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 4ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul, sendo recorrentes PENASUL ALIMENTOS LTDA. E DARBI JORGE MALLMANN e recorridos OS MESMOS.
Não há praticamente
dúvidas sobre qual seja a jornada de trabalho do empregado. Na maioria dos
casos, a resposta é simples: trabalha-se a partir do momento em que se passa o
cartão de ponto na entrada e deixa-se de trabalhar quando se passa o cartão de
ponto na saída. Essa é a noção predominante. Mas há situações em que o horário
pode ser alterado para antes e para depois de “bater o cartão”. São as situações
em que há a necessidade de tempo para a troca de uniforme e os
casos das horas “in itinere”.
No primeiro caso, o trabalhador era obrigado a usar
uniforme. O tempo gasto para vesti-lo (na entrada) e para se despir dele (na
saída) pode ser considerado tempo à disposição do patrão.
Na outra situação, o
tempo gasto no trajeto, na condução, é contado com hora de trabalho. Mas não
são em todos os casos; há um detalhe bem explicado nas decisões do Tribunal
Regional da 4ª Região/Rio Grande do Sul.
Acórdão do processo
0183200-14.2008.5.04.0771 (RO)
"EMENTA: TROCA DE UNIFORME. Tempo destinado à troca
de uniforme configura como à disposição do empregador e integrante da jornada
legal para todos os efeitos.
VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo
MM. Juiz da Vara do Trabalho de Lajeado, sendo recorrentes PERDIGÃO S.A. E
ROSANE MARIA DOS SANTOS e recorridos OS MESMOS.
A ré interpõe recurso
ordinário às fls. 262-9 pretendendo a reforma da sentença prolatada pelo Juiz
do Trabalho Rogério Donizete Fernandes quanto às diferenças de horas extras,
tempo destinado à troca de uniforme e FGTS.
A autora interpõe recurso
adesivo às fls. 276-81 quanto à base de cálculo do adicional de insalubridade e
honorários advocatícios.
Há contrarrazões da ré ao
recurso adesivo às fls. 284-90.
Conclusos para
julgamento.
É o relatório.
ISTO POSTO:
1. DO RECURSO DA RÉ.
1.1 DAS DIFERENÇAS DE
HORAS EXTRAS.
A sentença condena a ré
ao pagamento das horas em que não foi observada a tolerância legal de cinco
minutos antes e após a jornada, bem como das horas supostamente destinadas ao
banco de horas, pois ausente qualquer documento demonstrando quando e quantas
horas foram compensadas.
Entende a ré que o
sistema é valido e produtor de todos os seus efeitos. Invoca o teor da Súmula
nº 85 do TST e jurisprudência sobre o tema. E, ainda, também a desconsideração
de poucos minutos destinados à marcação de ponto, conforme disposição das
normas coletivas da categoria.
Em que pesem as razões do
recurso, a inconformidade não prospera, visto que não há normatização coletiva
autorizando jornada compensatória do tipo banco de horas. E a compensação
semanal já foi validada pelo Juízo na sentença.
Não havendo norma
coletiva autorizando a adoção do banco de horas, como é o caso dos autos, há
inviabilidade de qualquer pretensão de reforma.
No que concerne à
aplicação da Súmula nº 85 do TST, o recurso resta sem qualquer objeto, porque
deferido apenas o adicional extraordinário relativamente ao período não
autorizado por norma coletiva para compensação da jornada. E, ainda, a ré não
ataca qualquer dos fundamentos da sentença quando esta discrimina a existência
de horas extras com base nos registros de ponto e recibos de pagamento.
No que tange à dedução da
tolerância na marcação do ponto, a transação efetuada entre as categorias
profissional e econômica sobre a matéria ora examinada somente é possível em
relação ao período anterior à edição da Lei nº 10.243, de 19.JUN.2001, que acrescentou
o § 1º ao artigo 58, da CLT, determinando que Não serão descontadas nem
computadas como jornada extraordinária as variações de horário no registro de
ponto não excedentes de cinco minutos, observado o limite máximo de dez minutos
diários.
No período posterior à
edição da supracitada lei, é obrigatória a observância do critério estabelecido
no artigo 58, § 1º, da CLT, porquanto se trata de disposição atinente à saúde
do trabalhador, restando inválida a sua flexibilização por meio de negociação
coletiva que vise a reduzir o direito legalmente assegurado, estando correta a
sentença.
Nada a deferir.
1.2 DO TEMPO DESTINADO À
TROCA DE UNIFORME.
A ré insurge-se contra o
deferimento de vinte minutos diários pela troca de uniforme. Aduz que nesse tempo o empregado
não está trabalhando para a empresa e que a utilização de uniforme é
determinação do Serviço de Inspeção Federal. Invoca o artigo 4º da CLT.
Por óbvio que o tempo
gasto para a troca de uniforme, por exigência obrigatória da empresa, ainda que
decorrente de determinação de norma técnica sanitária, é tempo à disposição do
empregador e, como tal, deve ser remunerado. Não há dúvida de que este tempo
deveria estar registrado no cartão-ponto - antes e após a troca - como forma de
viabilizar concretamente esse período de tempo.
Não há razão para que
esse tempo seja desconsiderado da jornada legal de trabalho, dado que a empresa
exige obrigatoriamente o uso do uniforme. Por óbvio, a previsão normativa de
desconsideração do tempo destinado à marcação do registro de ponto não pode se
confundir com a de troca de uniforme, que é matéria diversa.
E, tendo o Juízo deferido
tempo razoável como necessário às trocas de uniforme, não há razão para
alteração do decidido.
Nada a prover.
1.3 DO FGTS.
Mantida a sentença que
condena a ré ao pagamento de parcelas de natureza remuneratória, remanesce o
deferimento do FGTS, por mero acessório.
Nada a prover.
2. RECURSO ORDINÁRIO
ADESIVO DO AUTOR.
2.1 DA BASE DE CÁLCULO DO
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE.
Insurge-se a autora
contra a definição do salário mínimo como base de cálculo do adicional de
insalubridade, pretendendo a utilização do salário contratual ou,
sucessivamente, do salário normativo.
Estabelece a Súmula
Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal:
Salvo nos casos previstos
na Constituição, o salário mínimo não pode ser usado como indexador de base de
cálculo de vantagem de servidor público ou de empregado, nem ser substituído
por decisão judicial
O TST, através da
Resolução nº 148/2008, publicada no DJ dos dias 08, 09 e 10.07.2008, altera a
redação de sua Súmula nº 228, a qual passou a contar com a seguinte redação:
A partir de 9 de maio de
2008, data da publicação da Súmula Vinculante nº 4 do Supremo Tribunal Federal,
o adicional de insalubridade será calculado sobre o salário básico, salvo
critério mais vantajoso fixado em instrumento coletivo.
Em decisão liminar, nos
autos do processo nº Rcl/6266, o STF suspendeu a aplicação da Súmula nº 228 do
TST, o que autoriza a conclusão de que o entendimento expressamente manifestado
pelo STF é no sentido de afastar a possibilidade de substituição da base de
cálculo do adicional de insalubridade por meio de decisão judicial, deixando a
critério das entidades sindicais e poder legislativo
Assim, entende-se, na
esteira da sentença, que é incidente a Súmula Vinculante nº 4 do Eg. STF,
devendo ser apurado o adicional de insalubridade com base no salário mínimo até
que a lei ou norma coletiva modifiquem essa base de cálculo.
No caso, as normas
coletivas proíbem a utilização do piso salarial normativo como salário
profissional ou substitutivo do salário mínimo.
Portanto, o adicional de
insalubridade deve ser calculado sobre o salário mínimo e, sendo incontroverso
que o autor já recebia desta forma, não há diferenças a serem satisfeitas.
Nada a prover.
2.2 DOS HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS.
Pretende a autora o
deferimento de honorários advocatícios, com base no artigo 133 da Constituição
Federal, sendo desnecessária a credencial sindical.
Não merece reparo a
sentença, que está calcada no entendimento jurisprudencial dominante,
consubstanciado nas Súmulas nos 219 e 329 do TST, com o qual se compartilha.
Nada a prover.
Ante o exposto,
ACORDAM os Magistrados integrantes da 2ª Turma do Tribunal Regional do
Trabalho da 4ª Região: por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso
ordinário da ré. Por maioria de votos, vencido em parte o Juiz Convocado Raul
Zoratto Sanvicente, negar provimento ao recurso ordinário da autora.
Intimem-se.
Porto Alegre, 17 de março
de 2010 (quarta-feira).
VANIA MATTOS
Relatora"
Acórdão do processo
0134500-41.2008.5.04.0404 (RO)
"EMENTA: HORAS
EXTRAS IN ITINERE. O tempo em que o empregado aguarda a condução fornecida pela
empregadora, em horário não atendido por transporte público, deve ser
considerado como horas in itinere. Provimento negado ao recurso da reclamada.
VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 4ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul, sendo recorrentes PENASUL ALIMENTOS LTDA. E DARBI JORGE MALLMANN e recorridos OS MESMOS.
Contra a sentença das
fls. 205-8, as partes apresentam recurso ordinário.
A reclamada (fls. 220-7)
pretende a reforma do julgado quanto a horas extras (in itinere e tempo à
disposição) e honorários advocatícios.
O reclamante (fls.
238-40) requer a alteração da sentença quanto à base de cálculo do adicional de
insalubridade. Apresenta contrarrazões às fls. 234-7.
A reclamada apresenta
contrarrazões às fls. 244-9.
Os autos são remetidos ao
Tribunal para julgamento.
É o relatório.
ISSO POSTO:
RECURSO ORDINÁRIO DA
RECLAMADA
1 HORAS EXTRAS IN ITINERE
A sentença entendeu
que o tempo em que o reclamante permanecia aguardando o ônibus fornecido pela
reclamada, que o conduzia para casa no final da jornada, é considerado como
horário in itinere, sendo que o período deve ser considerado na jornada.
A reclamada alega que a
pretensão era de horas à disposição pelo tempo de espera e não horas in
itinere. Sustenta que não está situada em local de difícil acesso ou não
servido por transporte público, não sendo aplicáveis a Súmula 90 do TST e o
art. 58, § 2º, da CLT. Afirma que o período em que esperava o ônibus não pode
ser considerado tempo à disposição, pois não estava prestando trabalho. Cita a
cláusula 17 das normas coletivas.
Examina-se.
É incontroverso que o
reclamante utilizava o transporte fornecido pela reclamada ao final da jornada,
e para tanto tinha de esperar a saída do ônibus.
Embora alegue, a
reclamada não comprova que existisse transporte público no horário de saída do
reclamante. Aliás, a presunção é de que efetivamente não havia, já que a
empresa precisava fornecer condução aos seus empregados.
A prova testemunhal (fl.
203) revela que o ônibus saía da empresa à 1h30min da madrugada, sendo que a
jornada de trabalho do autor em grande parte do contrato terminava às 0h18min
(registros das fls. 117-60).
Portanto, aplica-se ao
caso o § 2º do art. 58 da CLT, visto que o período em que o empregado aguarda a
condução fornecida pela empresa deve ser computado na jornada, mesmo que não
haja prestação de serviço nesse período. É razoável equiparar o tempo de aguardo
na empresa ao tempo de deslocamento, pois o efeito prático é o mesmo: enquanto
o empregado aguardava a condução fornecida pelo empregador ele estava em
situação análoga à do empregado que está em deslocamento, especialmente porque
o ônibus fornecido pela empresa era o único meio de transporte disponível no
seu horário de saída. Assim, ainda que a reclamada não esteja situada em local
de difícil acesso, isso não representa impeditivo para o acolhimento das horas
de itinerário.
Há previsão na norma coletiva
(exemplo, cláusula 17, fl. 35) no sentido de que as horas de deslocamento não
integrariam a jornada dos empregados. No entanto, tais disposições normativas
são inválidas por não afinadas com as hipóteses do art. 7º, incisos VI, XIII e
XIV, da CF que abrem espaço para a negociação coletiva impor restrições a
direito fundamental. As cláusulas normativas revelam-se abusivas, pois
constituem intervenção desmedida no núcleo do direito à contraprestação pelo
trabalho realizado, colidindo com o princípio constitucional do valor social do
trabalho (arts. 1º, IV, e 170 da CF/88). A interpretação do art. 7º, XXVI, da
CF tem de ser feita sistematicamente. O reconhecimento das convenções e acordos
coletivos não confere carta branca aos interessados para estipularem o que bem
entenderem. A restrição alusiva à extensão de jornada além das 8 horas diárias
e 44 horas semanais, inciso XIII do art. 7º da Constituição Federal só diz com
compensação; não com desconsideração de tempo de trabalho, por sinal regulado
no art. 58, § 2º, da CLT.
Não se verifica violação
aos artigos 7º, XXVI, e 5º, II, ambos da Constituição Federal e ao artigo 444
da CLT.
Provimento negado.
2 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
A reclamada alega que,
sendo reformada a sentença, devem ser excluídos os honorários advocatícios.
Analisa-se.
Mantida a condenação ao
pagamento de horas de deslocamento, deve ser mantida a condenação da reclamada
ao pagamento de honorários, até porque a reforma da sentença foi o único
argumento invocado pela recorrente nesse sentido.
Provimento negado.
RECURSO ORDINÁRIO DO
RECLAMANTE
BASE DE CÁLCULO DO
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE
A sentença entende que o
adicional de insalubridade deve ser calculado com base no salário mínimo,
enquanto não for editada lei ou conste em norma coletiva a fixação de outra
base de cálculo.
O reclamante requer que o
adicional de insalubridade seja calculado sobre o salário contratual. Cita
jurisprudências.
Com razão.
A base de cálculo do
adicional de insalubridade é o salário recebido, pois a Constituição Federal
fixou ser de natureza remuneratória o adicional em apreço. A adoção do salário
mínimo como base de cálculo não encontra respaldo constitucional. Destaca-se também
que nenhum dos adicionais que a Constituição prevê em seu art. 7º tem base
distinta do salário. Assim, a fixação de base diversa do salário para o
adicional de insalubridade não se harmoniza com a interpretação conforme a
integralidade das normas constitucionais e infraconstitucionais alusivas aos
direitos dos trabalhadores.
Dá-se provimento ao
recurso do reclamante condenar a reclamada ao pagamento de diferenças do
adicional de insalubridade pela consideração do salário básico como base de
calculo, com reflexos em férias, 13º salários, FGTS e horas extras.
Ante o exposto,
ACORDAM os Magistrados integrantes da 1ª Turma do Tribunal Regional do
Trabalho da 4ª Região:
Por unanimidade, negar
provimento ao recurso da reclamada. Por unanimidade, dar provimento ao recurso
do reclamante para condenar a reclamada ao pagamento de diferenças do adicional
de insalubridade pela consideração do salário básico como base de calculo, com
reflexos em férias, 13º salários, FGTS e horas extras.
Valor da causa que se
acresce em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Custas proporcionalmente acrescidas
em R$ 100,00 (cem reais).
Intimem-se.
Porto Alegre, 28 de abril
de 2010 (quarta-feira).
José Felipe Ledur
Relator"
** Comentários do
Advogado Eduardo Figueredo de Oliveira
As
decisões são claras e muito bem explicativas.
O que se percebe é que os
trabalhadores precisavam chegar mais cedo para vestir-se, mas marcar o ponto do
horário somente após colocar o uniforme. Ao final, deveriam passar o ponto
antes de despirem-se dos uniformes. Certamente, pelo menos vinte minutos
diários dentro do ambiente de trabalho...
Quanto ao uniforme, se a
empresa impõe o seu uso, o tempo gasto para vesti-lo e tirá-lo deve ser
considerado tempo de trabalho.
Quanto ao uso do coletivo
da empresa, a decisão foi igualmente justa. Raras são as vezes em que as
empresas oferecem transporte sem nada em troca. Por vezes deixam de efetuar os
descontos de vale-transporte, eis que se o transporte fosse custeado ainda que
parcialmente pelos empregados, estes certamente optariam por se deslocar com
mais liberdade de locomoção.
Pensamos que somente o
fato de oferecer o transporte diferenciado (para captar a preferência do
empregado) já é fator reconhecer as horas
“in itinere”. Afinal, existe alguma dúvida de que, a partir do embarque na
condução o trabalhador não esteja em ambiente de trabalho, rodeado pelos
colegas?
TAGS: hora-extra, uniforme
0 comentários:
Postar um comentário
Obrigado visitar e participar.
Por gentileza, antes de enviar comentários, informe o seu nome e o seu e-mail.