Motocicleta furtada dentro de campus universitário não gera indenização
Furto
em estacionamento tem interpretação divergente
"A 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça reformou sentença que condenou a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) ao ressarcimento de uma motocicleta furtada no estacionamento das dependências do Campus.
ACÁCIO FERNANDO DA SILVA
ajuizou a presente ação em face da UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS visando
ser ressarcimento do prejuízo material que sofreu em decorrência do furto de
sua motocicleta que se encontrava estacionada nas dependências da ré.
"A 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça reformou sentença que condenou a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) ao ressarcimento de uma motocicleta furtada no estacionamento das dependências do Campus.
O autor apresentou o
boletim de ocorrência registrado na delegacia e o ticket de estacionamento como
prova irrefutável do furto para pedir o ressarcimento do prejuízo material que
sofreu.
A decisão de 1ª instância
julgou a ação procedente condenando a universidade ao pagamento da quantia de
R$ 2.200, corrigida monetariamente desde a data do evento.
Inconformada, a defesa
recorreu da sentença alegando se tratar de uma autarquia púbica, sem qualquer
finalidade lucrativa; enfatizou ainda que a área do estacionamento é de uso
comum e que a vigilância existente objetiva a preservação e guarda dos bens da
Unicamp.
O relator do processo,
desembargador Dácio Tadeu Viviani Nicolau, entendeu que, na medida em que a
disponibilização do estacionamento constitui mera liberalidade da universidade
para proporcionar maior comodidade aos frequentadores do campus, longe estando
de caracterizar um contrato de depósito, a responsabilidade por veículos estacionados
na área é de quem ali os estaciona. 'Impossível, assim, responsabilizar a ré
pelos prejuízos que o autor sofreu, posto inexistente por parte da demandada o
dever de vigilância ou guarda de bens dos particulares frequentadores de suas
dependências', concluiu.
Os desembargadores
Antonio Vilenilson e José Luiz Gavião de Almeida também participaram do
julgamento e acompanharam o voto do relator, dando provimento ao recurso.
"
Apelação nº
0011140-66.2002.8.26.0000
Fonte: TJ/SP, acessado em
07/09/2011.
** Comentários do Advogado
Eduardo Figueredo de Oliveira
A decisão parece
equivocada, mas há uma justificativa. O recurso foi julgado pela Câmara de
Direito Privado, onde são analisados os casos de responsabilidade civil de
pessoas de direito privado. E nas demandas que envolvem interesses privados,
não prevalece a regra da responsabilidade objetiva do Estado (se a ação/omissão
do Estado provoca algum prejuízo, deve haver a indenização independente de
culpa), exceto nas demandas relativas a direito do consumidor. Por este
motivo, foi invocada a inexistência de contrato de depósito. Ora, mas se a
universidade é autarquia pública, deve responder de forma objetiva, até porque
o mesmo julgado menciona outro caso de furto no mesmo estabelecimento, o que
significa que a universidade (com base nas decisões proferidas em seu favor)
está deixando de zelar pelo espaço público. Álém disso, alguém duvidaria de que
a segurança lá existente agiria somente em benefício dos bens da universidade?
Vale a "teoria da aparência". Se há segurança privada, acredita-se em
que ela seja também para proteger as pessoas que por ali circulam.
Equivocada a decisão, que
é passível de reforma e tem toda a condição de ser alterada pelo STJ
e/ou pelo STF.
Segue a íntegra da
decisão:
"APELAÇÃO Nº :
0011140-66.2002.8.26.0000
(247.546.4/8-00)
COMARCA : CAMPINAS
APTE. : UNIVERSIDADE
ESTADUAL DE CAMPINAS UNICAMP
APDO. : ACACIO FERNANDO
DA SILVA
META 2 ***
'APELAÇÃO AÇÃO DE
REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS Furto de motocicleta em estacionamento da ré
Procedência Apelo da demandada. Consistência do inconformismo - Ausência de
contrato expresso ou tácito de depósito entre as partes - Estacionamento
disponibilizado gratuitamente para comodidade dos estudantes e frequentadores
da UNICAMP - Responsabilidade civil não caracterizada -Sentença reformada para
julgar improcedente a ação, invertidos os ônus da sucumbência, condenado o
autor ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.000,00 -
Recurso provido”
(voto 7659).
Trata-se ação de
indenização por danos materiais ajuizada por ACÁCIO FERNANDO DA SILVA em face
da UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS UNICAMP, julgada procedente nos termos da
r. sentença de fls. 55/57, proferida pelo Excelentíssimo Juiz de Direito
RONALDO FRIGINI. Inconformada, bate-se a ré pelo decreto de improcedência.
Sustenta ser uma autarquia púbica, sem qualquer finalidade lucrativa; que em
decorrência de sua natureza institucional são públicas todas as páreas onde se
acha instalada a Universidade, nada havendo em seus Estatutos e Regimento
Interno que permita inferir o exercício de qualquer atividade lucrativa que
pudesse dar margem à caracterização do depósito. Enfatiza que a área do
estacionamento é de uso comum e que a vigilância existente objetiva a
preservação e
guarda dos bens da
UNICAMP. Rebate a apresentação de BO como prova irrefutável do furto, bem como
a apresentação do ticket do estacionamento como prova de que motocicleta tenha
sido furtada no campus dada a existência de saídas da universidade sem guaritas
(fls. 82/93).
Isento do recolhimento do
preparo, o recurso, tempestivo, foi recebido (fls. 140) e respondido (fls.
141/142). Recebidos os autos na Secretaria desta Colenda Corte, o recurso foi
inicialmente distribuído ao Desembargador Osni de Souza (fls. 147) e nos termos
da Resolução 2004/05, redistribuído a este relator (fls. 148).
É O RELATÓRIO.
Dando ensejo ao presente
recurso, sobreveio o decreto de procedência condenando a demandada a pagar para
o autor a quantia de R$ 2.200,00, corrigida monetariamente desde a data do
evento, incidindo juros de
mora a contar da citação,
além das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 15%
sobre o valor da indenização.
Consistente o
inconformismo.
Respeitado o entendimento
do ilustre Sentenciante, não restou demonstrado nos autos que tenha havido
entre as partes contrato de depósito, ainda que tácito, uma vez que a
Universidade, por mera liberalidade e comodidade de seus os alunos e dos
freqüentadores de seu espaço, disponibiliza espaço gratuito para estacionamento
de veículos.
E na medida em que a
disponibilização do estacionamento constitui mera liberalidade da Universidade
com vistas a proporcionar maior comodidade aos freqüentadores do Campus, longe
estando de caracterizar um contrato de depósito, tem-se que a responsabilidade
por veículos estacionados na aludida área é de quem ali o estaciona.
Impossível, assim,
responsabilizar a ré pelos prejuízos que o autor sofreu, posto inexistente por
parte da demandada o dever de vigilância ou guarda de bens dos particulares
freqüentadores de suas dependências.
Neste sentido,
precedentes desta Egrégia Corte:
'RESPONSABILIDADE CIVIL.
Universidade Estadual de Campinas. Alegação de furto de motocicleta na área de
estacionamento da universidade. Contrato de depósito não caracterizado.
Inexistência do dever de vigilância em relação aos bens particulares dos
usuários do estacionamento. Inexistência de responsabilidade por eventuais
furtos dos veículos estacionados no local. Pedido de indenização julgado
procedente pela sentença. Recursos providos para julgar improcedente a ação,
prejudicada a litisdenunciação.” (Apelação 0053811- 14.2006.8.26.0114 10ª
Câmara de Direito Público Relator Des. ANTONIO CARLOS VILLEN J. em 11/04/11).'
'INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAIS. Furto de Veículo ocorrido nas dependências da ré. Ausência de
contrato expresso ou tácito de depósito entre as partes. Estacionamento
disponibilizado para comodidade dos estudantes, de forma gratuita.
Responsabilidade civil não caracterizada. Sentença mantida. Recurso
improvido" (Apelação 990.10.238537-0 9ª Câmara de Direito Público Relator
Des.
ANTÔNIO RULLI J. em
04/08/10).'
'RESPONSABILIDADE. CIVIL.
Furto de bicicleta em dependências de universidade.
Autarquia
municipal, sem fins lucrativos, que dispensa local para estacionamento de
veículos, motocicletas e bicicletas. Liberalidade que não implica dever de
vigilância ou guarda sobre os bens. Contratação de empresa "privada para
prestação de serviços de vigilância que visa somente à proteção do patrimônio
público Ausência de responsabilidade. Demanda improcedente - Recurso não
provido”
(Apelação 994060658397
(5908915200) 12ª Câmara de Direito Público - Relator: EDSON FERREIRA J. em
10/02/2010 - Data de registro: 19/03/2010).'
'RESPONSABILIDADE CIVIL -
Furto de motocicleta em estacionamento da Universidade Estadual de Campinas
NICAMP - Pedido de indenização. nexistência de dever de indenizar - Espaço
cedido gratuitamente a alunos e freqüentadores da universidade - Inexistência de
pagamento pelo estacionamento ou qual quer outro beneficio à administração -
Sentença Mantida - Recurso Improvido.” (Apelação Com
Revisão 3163495000 3ª
Câmara de Direito Público - Relator: ANTÔNIO CARLOS MALHEIROS J. em
23/09/2008).'
Impõe-se, destarte,
albergar o reclamo da ré para julgar improcedente o pedido, invertidos os ônus
da sucumbência,
condenado o autor ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$
1.000,00.
Ante o exposto, dá-se
provimento ao recurso.
VIVIANI NICOLAU
Relator"
*** Meta 2: Diz respeito
às metas impostas pelo CNJ para que tribunais decidam certos processos parados
já há alguns anos nas suas prateleiras. O objetivo da Meta 2 é a
concretização do direito à razoável duração do processo. Ocorre que os
objetivos da Meta 2 têm servido a descalabros, porque no afã de cumprir os
prazos, certos juízes e alguns tribunais estão decidindo de qualquer
jeito, sem realmente analisar, com profundidade e atenção, os processos
submetidos aos seus cuidados. Limpam as suas prateleiras, ficam bem com o
CNJ, mas fazem uma verdadeira "sujeira" com os cidadãos que
dependem de suas decisões. É uma das primeiras vezes que vemos um direito
constitucionalmente assegurado a ser utilizado contra o beneficiário da
garantia.
Embora a decisão faça
parte da Meta 2, acreditamos que o julgamento foi proferido por
"setor" que não tivesse tal atribuição, pois tudo leva a crer que o
processo devesse ser julgado por uma das Câmaras de Direito Público.
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