CONCURSO PÚBLICO E CLASSIFICADOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS: STF DECIDIRÁ SOBRE (DIREITO A ?) NOMEAÇÃO.
O
plenário (virtual) do STF reconheceu a existência de repercussão geral (reconhece
que julgamento tem importância que vai além do interesse das partes envolvidas
na causa) no Recurso Extraordinário nº. 837.311, no qual se discute o direito
subjetivo à nomeação de candidatos aprovados fora do número de
vagas previstas no edital de concurso público no caso de surgimento de novas
vagas durante o prazo de validade do certame.
O caso
trata de candidatos ao cargo de Defensor Público de Piauí, que não foram
classificados dentro do número de vagas (total de 30) oferecidas pelo edital de
chamamento e consideram inconstitucional a abertura de novo concurso, que foi
anunciada durante a vigência de concurso precedente.
Segundo
o Mandado de Segurança o concurso, com validade de dois anos, foi prorrogado
por igual período e ao final da prorrogação, sem que os classificados
fossem chamados, o Estado reconheceu a necessidade de preencher vagas de
Defensores Públicos e anunciou a futura abertura de novo concurso público.
Durante a tramitação da ação, todos os classificados não convocados foram
chamados a integrar o processo, pois o interesse deles seria afetado por
decisão judicial que viesse a ser proferida.
Peculiaridades
O artigo
37, incisos III e IV da Constituição Federal dispõe que “o prazo de validade do concurso público será de até dois
anos, prorrogável uma vez, por igual período” e que “durante
o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em
concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade
sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira”.
O impasse jurídico surgiu a partir da constatação
de alguns fatos: a) o concurso
ofereceu ao público somente trinta (30) vagas; b) durante a prorrogação do concurso, foram abertas outras vagas
diversas daquelas não preenchidas e oferecidas no concurso; c) havia candidatos aguardando
convocação; d) o Estado reconheceu a
necessidade de mais Defensores e anunciou um novo concurso imediatamente após a
expiração da prorrogação.
A
questão jurídica é realmente interessante e relevante.
O Estado
ofereceu apenas trinta vagas de Defensor, sem mencionar a formação de
cadastro-reserva, tampouco a possibilidade de
aproveitamento de candidatos para outras vagas que viesses a surgir
durante
o prazo de fluência. O concurso e a lista de espera se destinavam a preencher
somente as vagas oferecidas.
O
impasse pode ser assim esclarecido: digamos que os quadros da Defensoria, por
exemplo, são compostos por 180 (cento e oitenta) vagas classificadas de forma ordinal
entre 1ª a 180ª. O concurso ofereceu expressamente da 1ª
a 30ª vaga. Pode o candidato reivindicar o preenchimentos de claros relativos às
vagas 31ª, 32ª, 33ª... ? Desde que fosse respeitada a oferta de trinta vagas e
não houvesse desistência para estas mesmas vagas, um candidato aprovado em 50ª,
70ª, 90ª poderia ser convocado para ocupar as primeiras trinta vagas? O Estado está obrigado a convocar candidatos
classificados muito além da 50ª posição, quando teve a intenção de oferecer
somente três dezenas de vagas e aproveitar, teoricamente, os trinta
melhores?
Vejamos
o disposto na cabeça do artigo 37 da Constituição Federal:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
e, também, ao seguinte:”
É sabido
que, em tese, os concursos públicos
buscam garantir a impessoalidade e a seleção dos melhores candidatos. Neste
contexto, se o concurso oferece trinta vagas, os trinta melhores candidatos seriam absorvidos pelas nomeações das
vagas oferecidas.
Se
houvesse a desistência dos mais bem classificados a “fila andaria” e os demais,
conforme o desempenho obtido individualmente, seriam convocados posteriormente,
obedecido o número de vagas inicialmente ofertadas.
Então,
surge uma questão. Os classificados além da 30ª vaga seriam os mais aptos e
preparados? Os classificados além da 70ª posição seriam os mais aptos e
preparados? Os classificados além das 120ª posição seriam os mais aptos e
preparados? E se acaso houvesse um novo concurso no qual se oferecessem doze
vagas, o Estado não poderia selecionar, novamente, os doze candidatos mais bem
preparados? Os candidatos classificados além da 30ª posição, embora ainda não
convocados, poderiam ser rotulados de ineptos? Eles poderiam ser considerados
piores que os primeiros, principalmente quando alguns foram depois nomeados,
via concurso público, ao cargo de Juiz? Por qual motivo abrir um novo concurso
e consumir recursos públicos quando há a possibilidade de aproveitar
candidatos que não foram excluídos?
Há uma
clara colisão acerca de interpretações do princípio da eficiência e a sua
harmonização com o princípio da impessoalidade, da legalidade, economicidade...
Eis aqui,
para uma melhor compreensão da questão jurídica, das premissas lançadas no acórdão
do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí para determinar a nomeação e a
posse dos candidatos classificados além da 30ª posição:
“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.
CONCURSO PÚBLICO. DEFENSOR PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ. CONVOCAÇÃO DE CANDIDATOS
CLASSIFICADOS FORA DO NÚMERO ESTABELECIDO NO EDITAL. ANÚNCIO DE NOVO CONCURSO
DURANTE A VIGÊNCIA DO ANTERIOR. DEMONSTRADA PELA ADMINISTRAÇÃO A NECESSIDADE DE
CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. DISCRICIONARIEDADE. INEXISTÊNCIA. DIREITO SUBJETIVO À
NOMEAÇÃO. RECONHECIMENTO. CONVERSÃO DA EXPECTATIVA EM DIREITO LÍQUIDO E CERTO
DOS IMPETRANTES. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. DECISÃO UNÂNIME.
1. A
discricionariedade do Poder Público de nomear candidatos classificados fora
do número previsto no edital, deixa de
existir a partir do momento em que a Administração pratica atos no intuito de
preencher as vagas surgidas e demonstra expressa a sua necessidade de pessoal.
2. Não
é licito à Administração, dentro do prazo de validade do concurso público, nomear candidatos além do número
inicialmente previsto no edital em detrimento de outros em igual situação.
3. No momento em que a Administração
expressamente manifesta a intenção de fazer novas contratações por necessidade
de Defensor Público em todo o Estado do Piauí; anuncia a realização de novo
concurso dentro do prazo de validade do certame anterior e nomeia candidatos
aprovados fora da ordem de classificatória e do limite de vagas inicialmente
ofertadas no edital, o ato de nomeação dos impetrantes deixa de ser discricionário
para tornar-se vinculado, convertendo-se a mera expectativa em direito líquido
e certo. Precedentes.
4. Ordem concedida. Unânime. “.
A partir
do futuro pronunciamento do STF haverá um maior rigor com a oferta de vagas. Os
editais serão mais claros, menos propensos a interpretações. As vagas ofertadas
também serão em menor número. E, na nossa avaliação, desde que se prestigie
literalmente o princípio da eficiência e da seleção dos mais preparados,
poderá haver uma efetiva restrição quanto à oferta de vagas. De outro lado,
a interpretação pode abrir brechas para burlar a impessoalidade, pois basta a
realização de novo concurso para deixar de respeitar a fila formada pelo
concurso precedente.