COOPERADO TEM DIREITOS TRABALHISTAS?
“(...)
Cooperativismo e mutualismo, praticamente, resultam num só fato: a cooperação
de muitos para a realização de um interesse comum.”[1]
Para responder à questão precisamos
recorrer aos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT, os
quais dispõem:
“Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade
econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os
efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as
instituições de beneficência, as
associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que
admitirem trabalhadores como empregados.
(...)
Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física
que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência
deste e mediante salário.”.
Eis aí chave para se descobrir se
alguém é empregador ou se alguém é empregado.
Para ser empregador, há
a necessidade de se admitir pessoa física para a prestação de serviços
habituais, cuja direção/orientação e remuneração do trabalho dependam do
contratante. Para ser considerado
empregado há a necessidade de que o trabalhador, pessoalmente, preste
serviços com habitualidade, constância, subordinação (sinônimo de cumprimento
de ordens) e recebimento de salário.
E por qual motivo não escrevemos antes
sobre o tema? Porque o fenômeno das “cooperativas de faz-de-conta” veio sendo
desestimulado ao longo dos anos. Muitas “cooperativas de fachada” foram levadas
à Justiça do Trabalho, e os seus cooperados foram considerados verdadeiros
empregados e detentores de todos os direitos trabalhistas. Fatalmente, os donos
das “cooperativas de fachada” passaram a ter prejuízos financeiros, portanto a
aventura foi desestimulada com o passar do tempo.
Com a onda de condenações trabalhistas
- que ocorreu até o ano de 2010 -, aliado ao crescimento da oferta do emprego
formal, as falsas cooperativas quase, ou praticamente, deixaram de existir.
Dizemos “quase” ou praticamente, pois
as “cooperativas de fachada” ainda são usadas para mascarar relação de emprego.
Para ser um verdadeiro cooperado, há a
necessidade de participar das atividades, da vida da cooperativa. Há a
necessidade de se contribuir pessoalmente para o desenvolvimento da cooperativa
e de interferir nos destinos da sociedade. Você, “cooperado”, tem esse poder?
Você, cooperado, pode interferir na vida da sociedade ou somente cumpre ordens
e recebe salário no final do mês? Somente cumpre ordens? Então, é possível que
você seja um empregado comum que deve ter assegurado todos os seus direitos.
Recentemente durante uma viagem que
fazia, passando por alguns locais da Capital, percebi que vários cobradores de certa
cooperativa de transportes coletivos reclamavam que seriam demitidos. Seriam
demitidos, pois a cooperativa não contaria mais com a figura dos cobradores nos
seus veículos. Ou seja, o motorista guiaria o veículo e também faria a cobrança
e troco das tarifas.
Cooperado de verdade não pode ser demitido.
O cooperado de verdade demite-se, por sua própria vontade, da cooperativa.
O verdadeiro cooperado não tem direitos
trabalhistas. Já o cooperado de faz-de-conta é legalmente protegido.
Como se caracteriza uma verdadeira
cooperativa? As verdadeiras cooperativas organizam os meios de produção e de
prestação de serviços para os seus “sócios”; para aqueles que emprestam
trabalho à organização. Cooperativas visam ao bem do todo, ao bem geral da
sociedade e dos cooperados.
A Doutrina destaca as peculiaridades de
tais organizações. De Plácido e Silva abordoou a noção de cooperativa nos
seguintes moldes:
“COOPERATIVISMO E
MUTUALISMO – Cooperativismo e mutualismo, praticamente, resultam num só fato: a
cooperação de muitos para realização de um interesse comum.
Ambos se geram da
idéia de assistência ou proteção recíproca, ou do desejo de defesa mutua dos
interesses comuns.
E ambos formam conceitos, experimentalmente definidos no
velho adágio de que a união faz a força. (....)”.
O Jurista Rubens Requião também assinalou
os principais traços distintivos da cooperativa:
“O intuito lucrativo, traço genérico de
todas as sociedades empresárias, na cooperativa é substituído pelo proveito
comum resultante do esforço solidário dos cooperados. Mais que a agregação de
capitais, o que conta no espírito do cooperativismo é a ajuda mútua. A
cooperativa visa, não ao proveito egoístico do capitalista (que agrega
capitais, assume riscos para obter lucro), mas por meio do desenvolvimento
econômico e social que propiciar, à melhoria da qualidade de vida de seus
membros. O resultado individualista, proporcional ao capital investido e o
risco assumido, é substituído pelo proveito geral de todos os membros do corpo
social.”. Grifamos.
A concepção de cooperativismo decorre da noção de
colaboração mútua, da união de esforço em benefício de todos os que se vinculam
pelas ações individuais e conjugadas.
Fundamentada nesta premissa – a fim de
facilitar a organização dos que não contem com capitais para a formação de
outros tipos societários – editou-se a Lei Federal nº. 5.674/71. Os artigos 3º,
4º, 29 e 37 da citada Lei Federal nº. 5.674/71 tratam da criação das sociedades
cooperativas, nos seguintes termos:
“Art. 3° Celebram
contrato de sociedade cooperativa as
pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o
exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro.
(...)
Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas,
com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a
falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se
das demais sociedades pelas seguintes características:
I - adesão voluntária, com número ilimitado
de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviços;
II -
variabilidade do capital social representado por quotas-partes;
III - limitação
do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o
estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado
para o cumprimento dos objetivos sociais;
IV -
incessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à
sociedade;
V - singularidade de voto, podendo as
cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção
das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade;
VI - quorum para
o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no número de
associados e não no capital;
VII - retorno das sobras líquidas do exercício,
proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em
contrário da Assembléia Geral;
VIII -
indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e
Social;
IX - neutralidade
política e indiscriminação religiosa, racial e social;
X - prestação de assistência aos associados, e,
quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa;
XI - área de
admissão de associados limitada às possibilidades de reunião, controle,
operações e prestação de serviços.
(...)
Art. 29. O ingresso nas cooperativas é livre a todos
que desejarem utilizar os serviços prestados pela sociedade, desde que adiram
aos propósitos sociais e preencham as condições estabelecidas no estatuto,
ressalvado o disposto no artigo 4º, item I, desta Lei.
(...)
Art. 37. A cooperativa assegurará a igualdade de
direitos dos associados sendo-lhe defeso:
I - remunerar a quem agencie novos associados;
II - cobrar prêmios ou ágio pela entrada de novos associados
ainda a título de compensação das reservas;
III - estabelecer restrições de qualquer espécie ao livre
exercício dos direitos sociais.”.
Então? Você recebe ordens e salário
mensal, ou contribui para o desenvolvimento da cooperativa e interfere nos
destinos da associação? Se você só recebe ordens e salário mensal, você é
empregado. E sendo empregado, você tem todos os direitos trabalhistas
assegurados.