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terça-feira, 14 de junho de 2022

PRODUÇÃO PARLAMENTAR: ATIVIDADE LEGISLATIVA DEVE SER EFICIENTE, EFICAZ E CONFORME A CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

Não são poucos os projetos de lei apresentados em câmaras municipais e assembleias legislativas que, se convertidos em leis, em uma análise superficial, têm grande probabilidade de serem consideradas leis inconstitucionais. A quantidade de propostas legislativas aumenta à medida em que se aproximam as eleições.


Desde 27/05/2022 tramita na Assembleia Legislativa do Estado do São Paulo (ALESP) o Projeto de Lei Complementar (PLC) de nº35/2022. Este PLC autoriza o Poder Executivo (Governador do Estado de São Paulo) a "transformar em Agente Policial os cargos ocupados pelos funcionários administrativos pertencentes ao Quadro da Segurança Pública." Grifamos e sublinhamos. 


Interessante notar que, em vez de imediatamente transformar os referidos “cargos ocupados pelos funcionários administrativos” em cargos de Agente Policial, o PLC nº 35/2022 tão e somente autoriza o Poder Executivo a fazer esta transformação. Qual objetivo dessa autorização? Por qual razão a ementa (resumo) do PLC não reproduz o mesmo conteúdo normativo do PLC nº 35//2022? A ementa afirma que o PLC nº 35/2022 "Dispõe sobre a transformação dos Cargos Administrativos da Secretaria de Segurança Pública em Agente Policial, ambos pertencentes ao Quadro de funcionários da Secretaria de Segurança Pública do Estado."


Em nosso modesto entendimento não haveria a mínima necessidade de um Projeto de Lei Complementar (lei hierarquicamente inferior à Constituição do Estado) autorizar o Chefe do Poder Executivo, porque ao Governador do Estado compete privativamente iniciar o processo legislativo sobre o tema do PLC nº 35/2022. É a chamada iniciativa legislativa privativa, contida no art. 24, § 2º, 1 e 4, da Constituição do Estado de São Paulo. Vejamos:

“Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

(...)

§2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:

1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração;

(...)

4 - servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (NR)”


E esta competência privativa do Governador de Estado, mesmo antes da promulgação da Constituição do Estado de São Paulo (05/10/1989), já era analisada, julgada e pacificada pelo STF, conforme decisão do ano de 1987:

“REPRESENTAÇÃO. ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 4º, 5º, 6º E 7º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 317, DE 09.03.83, DO ESTADO DE SÃO PAULO, REFERENTES A TRANSFORMAÇÃO DE CARGOS PUBLICOS E OUTRAS PROVIDENCIAS. MATÉRIA DA INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. OFERECIMENTO DE EMENDAS NA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA, QUE IMPORTARAM EM AUMENTO DA DESPESA PÚBLICA, PREVISTA NO PROJETO. A SANÇÃO APOSTA A LEI PELO ENTÃO GOVERNADOR NÃO SANA O VÍCIO. PROCEDENCIA DA REPRESENTAÇÃO, POR OFENSA AO ART. 57, INCS. II E V, PARAGRAFO ÚNICO, LETRA A, COMBINADO COM O ART. 13, INC. III, DA LEI MAGNA.

(Rp 1278, Relator(a): DJACI FALCAO, Tribunal Pleno, julgado em 02/09/1987, DJ 09-10-1987 PP-21775  EMENT VOL-01477-01 PP-00036)


Mais recentemente, no ano de 2019, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo analisou situação envolvendo a criação de vagas de empregos públicos na USP. A criação destas vagas deu-se por ato infralegal (Resolução) produzido por agente diverso do Chefe do Executivo (Reitor da USP). A decisão, de modo resumido, demarca e reafirma a competência do Chefe do Executo para dispor sobre o assunto:

“APELAÇÃO CÍVEL – ANULATÓRIA – Contratação de servidores pela Universidade de São Paulo – Decisão do Tribunal de Contas do Estado determinando a rescisão dos contratos, dada a criação de vagas por intermédio de Resolução do Magnífico Reitor – Empregos públicos que só podem ser criados por lei em sentido estrito – Exegese do artigo 24, §2º, 1, da Constituição do Estado de São Paulo – Mesmo diante da realização de concurso público, o preenchimento das vagas atinentes a empregos públicos criados por Resolução da Universidade, na atual ordem constitucional vigente, não se mostra viável – Decisão do Tribunal de Contas do Estado escorreita – Reexame necessário e recurso voluntário providos.”  
(TJSP;  Apelação Cível 1030850-36.2015.8.26.0053; Relator (a): Osvaldo de Oliveira; Órgão Julgador: 12ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes - 1ª Vara de Fazenda Pública; Data do Julgamento: 13/03/2019; Data de Registro: 27/03/2019)


Do STF - e já sob a regência da Constituição Federal de 1988 (e Constituição do Estado de 1989) - citamos um julgado de 1997 destacando a iniciativa privativa do Chefe do Executivo para dispor de certas matérias:

“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA LIMINAR. SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS. COMPETÊNCIA DO GOVERNADOR PARA INICIATIVA DE PROJETO DE LEI. ARTIGO 63, I, DA CF. É de observância compulsória pelos Estados-membros as linhas básicas do modelo federal do processo legislativo, especialmente no tocante ao artigo 63, I, da CF. Liminar deferida.”

(ADI 1594 MC, Relator(a): NELSON JOBIM, Tribunal Pleno, julgado em 30/04/1997, DJ 29-08-1997 PP-40215  EMENT VOL-01880-01 PP-00057)


Mas supondo que o PLC nº 35/2022 jamais tenha pretendido autorizar aquilo que Constituição Federal e a Constituição Estadual já atribuem ser responsabilidade exclusiva do Governador do Estado, também é possível imaginar que o Projeto de Lei Complementar nº 35/2022 esteja tentando contornar algo que há tempos é considerado inconstitucional pelo STF: trata-se do provimento derivado de cargos, empregos e funções públicas.  Em 2001 o Ministro Celso de Mello relatou importante decisão que se aplica, sob medida, ao conteúdo do PLC nº 35/2022:

“E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADEPRECEITO NORMATIVO, DE INICIATIVA PARLAMENTAR, QUE, ALÉM DE IMPLICAR AUMENTO DA DESPESA PÚBLICA, TAMBÉM INTERVÉM NO REGIME JURÍDICO DE SERVIDORES PÚBLICOS VINCULADOS AO PODER EXECUTIVOUSURPAÇÃO DO PODER DE INICIATIVA RESERVADO AO GOVERNADOR DO ESTADO – INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL – PROVIMENTO DERIVADO – ASCENSÃO E “ENQUADRAMENTO”INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL – OFENSA AO ARTIGO 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICOCONTEÚDO MATERIAL DA NORMA LEGAL IMPUGNADA (ART. 70 DA LEI Nº 6.161/2000) QUE, AO TORNAR SEM EFEITO ATOS ADMINISTRATIVOS EDITADOS PELO GOVERNADOR DO ESTADO, FEZ INSTAURAR SITUAÇÃO FUNCIONAL INCOMPATÍVEL COM O PRINCÍPIO DO CONCURSO PÚBLICO – IMPOSSIBILIDADE – OFENSA AOS POSTULADOS CONSTITUCIONAIS DO CONCURSO PÚBLICO, DA SEPARAÇÃO DE PODERES E DA RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO – MEDIDA CAUTELAR ANTERIORMENTE DEFERIDA PELO PLENÁRIO DESTA SUPREMA CORTE – REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO TEMA – PRECEDENTES – PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA PELA INCONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO LEGAL QUESTIONADO – AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE. PROCESSO LEGISLATIVO E INICIATIVA RESERVADA DAS LEIS – O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, que resulte da usurpação de poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do diploma legislativo eventualmente editado. Situação ocorrente na espécie, em que o diploma legislativo estadual, de iniciativa parlamentar, incidiu em domínio constitucionalmente reservado à atuação do Chefe do Poder Executivo: regime jurídico dos servidores públicos e aumento da despesa pública (RTJ 101/929 – RTJ 132/1059 – RTJ 170/383, v.g.). A usurpação da prerrogativa de instaurar o processo legislativo, por iniciativa parlamentar, qualifica-se como ato destituído de qualquer eficácia jurídica, contaminando, por efeito de repercussão causal prospectiva, a própria validade constitucional da norma que dele resulte. Precedentes. Doutrina. Nem mesmo eventual aquiescência do Chefe do Poder Executivo mediante sanção, expressa ou tácita, do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, tem o condão de sanar esse defeito jurídico radical. Insubsistência da Súmula nº 5/STF (formulada sob a égide da Constituição de 1946), em virtude da superveniente promulgação da Constituição Federal de 1988. Doutrina. Precedentes. SIGNIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DO REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (CIVIS E MILITARES) – A locução constitucional ‘regime jurídico dos servidores públicos’ corresponde ao conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes. Nessa matéria, o processo de formação das leis está sujeito, quanto à sua válida instauração, por efeito de expressa reserva constitucional, à exclusiva iniciativa do Chefe do Poder Executivo. Precedentes. O CONCURSO PÚBLICO REPRESENTA GARANTIA CONCRETIZADORA DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE – O respeito efetivo à exigência de prévia aprovação em concurso público qualifica-se, constitucionalmente, como paradigma de legitimação ético-jurídica da investidura de qualquer cidadão em cargos, funções ou empregos públicos, ressalvadas as hipóteses de nomeação para cargos em comissão (CF, art. 37, II). A razão subjacente ao postulado do concurso público traduz-se na necessidade essencial de o Estado conferir efetividade ao princípio constitucional de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, vedando-se, desse modo, a prática inaceitável de o Poder Público conceder privilégios a alguns ou de dispensar tratamento discriminatório e arbitrário a outros. Precedentes. Doutrina. RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO E SEPARAÇÃO DE PODERES – O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência político-administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de poderes, desconstituir, por ato legislativo, atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte a função primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação “ultra vires” do Poder Legislativo, que não pode, em sua condição político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais.

(ADI 2364, Relator(a): CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 17/10/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-045  DIVULG 06-03-2019  PUBLIC 07-03-2019)

 

E em 2018, mantendo a coerência decisória, o mesmo Ministro Celso de Mello, reafirmou a competência privativa do Governador de Estado. No caso, decidiu-se especificamente sobre lei que “autoriza o Poder Executivo” a tratar de tema da alçada privativa do Governador de Estado:

“E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI Nº 1.595/2011 EDITADA PELO ESTADO DO AMAPÁ – DIPLOMA LEGISLATIVO DE CARÁTER AUTORIZATIVO QUE, EMBORA VEICULADOR DE MATÉRIAS SUBMETIDAS, EM TEMA DE PROCESSO DE FORMAÇÃO DAS LEIS, AO EXCLUSIVO PODER DE INSTAURAÇÃO DO CHEFE DO EXECUTIVO, RESULTOU, NÃO OBSTANTE, DE INICIATIVA PARLAMENTAR – SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – REGIME JURÍDICO – REMUNERAÇÃO – LEI ESTADUAL QUE “AUTORIZA O PODER EXECUTIVO A REALINHAR O SUBSÍDIO DOS SERVIDORES AGENTES E OFICIAIS DE POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO AMAPÁ”USURPAÇÃO DO PODER DE INICIATIVA RESERVADO AO GOVERNADOR DO ESTADO – OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA SEPARAÇÃO DE PODERESINCONSTITUCIONALIDADE FORMAL – REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – PRECEDENTES – PARECER DA PROCURADORIA- -GERAL DA REPÚBLICA PELA INCONSTITUCIONALIDADE – AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE. PROCESSO LEGISLATIVO E INICIATIVA RESERVADA DAS LEIS – O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, que resulte da usurpação de poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do diploma legislativo eventualmente editado, ainda que este meramente autorize o Chefe do Poder Executivo a dispor sobre remuneração funcional e a intervir no regime jurídico dos agentes públicos. Situação ocorrente na espécie, em que o diploma legislativo estadual, de iniciativa parlamentar, incidiu em domínio constitucionalmente reservado à atuação do Chefe do Poder Executivo: regime jurídico dos servidores públicos e disciplina da remuneração funcional, com consequente aumento da despesa pública (RTJ 101/929 – RTJ 132/1059 – RTJ 170/383, v.g.). A usurpação da prerrogativa de instaurar o processo legislativo, por iniciativa parlamentar, mesmo que se cuide de simples autorização dada ao Governador do Estado para dispor sobre remuneração de servidores públicos locais e de, assim, tratar de matéria própria do regime jurídico dos agentes estatais, qualifica-se como ato destituído de qualquer eficácia jurídica, contaminando, por efeito de repercussão causal prospectiva, a própria validade constitucional da norma que dele resulte. Precedentes. Doutrina. Nem mesmo eventual aquiescência do Chefe do Poder Executivo mediante sanção, expressa ou tácita, do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, tem o condão de sanar esse defeito jurídico radical. Insubsistência da Súmula nº 5/STF (formulada sob a égide da Constituição de 1946), em virtude da superveniente promulgação da Constituição Federal de 1988. Doutrina. Precedentes. SIGNIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DO REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (CIVIS E MILITARES) – A locução constitucional “regime jurídico dos servidores públicos” corresponde ao conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes. Nessa matéria, o processo de formação das leis está sujeito, quanto à sua válida instauração, por efeito de expressa reserva constitucional, à exclusiva iniciativa do Chefe do Poder Executivo. Precedentes. ATUAÇÃO DO ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO NO PROCESSO DE FISCALIZAÇÃO CONCENTRADA DE CONSTITUCIONALIDADE – O Advogado-Geral da União – que, em princípio, atua como curador da presunção de constitucionalidade do ato impugnado (RTJ 131/470 – RTJ 131/958 – RTJ 170/801-802, v.g.) – não está obrigado a defender o diploma estatal, se este veicular conteúdo normativo já declarado incompatível com a Constituição da República pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos proferidos no exercício de sua jurisdição constitucional. Precedentes.

(ADI 4724, Relator(a): CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 01/08/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-176  DIVULG 27-08-2018  PUBLIC 28-08-2018)


E especificamente sobre o provimento derivado resultante da transformação de cargos pré-existentes em novos cargos públicos, voto da Ministra Rosa Weber no ano de 2020, no STF, de modo elucidativo esclareceu o seguinte:

“EMENTA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS. LEI COMPLEMENTAR N. 1.260/15 DO ESTADO DE SÃO PAULO. TRANSFORMAÇÃO E EXTINÇÃO DO CARGO DE AGENTE ADMINISTRATIVO JUDICIÁRIO EM ESCREVENTE TÉCNICO JUDICIÁRIO. PROVIMENTO DERIVADO. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO ARTIGO 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DESTE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE IMPEDE ASCENSÃO, TRANSFERÊNCIA, ENQUADRAMENTO, MUDANÇA OU TRANSFORMAÇÃO EM OUTRO CARGO. SÚMULA VINCULANTE Nº 43 DESTA CORTE. PROCEDÊNCIA. 1. Alegação de inconstitucionalidade material da Lei Complementar 1.260/15 do Estado de São Paulo, que dispõe sobre a transformação e extinção do cargo de Agente Administrativo Judiciário em Escrevente Técnico Judiciário, ambos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Uma vez aprovado em concurso e investido no cargo de Agente Administrativo Judiciário é vedado ao servidor galgar outro cargo – o de Escrevente Técnico Judiciário – sem a realização de prévio concurso público. Situação caracterizadora de transposição ou reenquadramento de cargos sem concurso público. A Lei Complementar 1.260/15 do Estado de São Paulo realizou provimento derivado. Inconstitucionalidade por afronta à exigência da prévia aprovação em concurso público para investidura em cargo público (art. 37, II, da Lei Maior) e ao princípio da igualdade (art. 5º, caput, da Constituição da República). Incidência da jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Federal e da Súmula Vinculante nº 43. 2. Pedido da ação direta julgado procedente.”

(ADI 5817, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 20/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-117  DIVULG 11-05-2020  PUBLIC 12-05-2020)


A respeito da necessidade de observância da Súmula Vinculante (nº 43), cabe aqui citar o mandamento constitucional contido no art. 103-A, da CF/88:

“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.      

§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

(...)

§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.”    


A Súmula Vinculante é decisão judicial que estabelece baliza de observância geral e obrigatória para a elaboração de atos do Estado, sejam estes atos decisões judiciais, atos administrativos e/ou atos normativos de qualquer espécie. E a respeito da Súmula Vinculante nº 43, vejamos o seu teor:

“Súmula vinculante 43

Enunciado

É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.”


É bom que se diga que a citada Lei Complementar nº 1.260/15, do Estado de São Paulo, resultou de proposição legislativa do Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Esta lei animou  servidores públicos e parlamentares estaduais, porque imaginava-se que ali surgia a possibilidade de serem concretizadas demandas antigas e de expressivo número de servidores. De fato, tudo indicava que jamais seria invalidada pelo Poder Judiciário uma lei que interessava ao próprio Judiciário estadual. Mas no STF a iniciativa não prosperou. 


Então, principalmente em tempos de eleição, é bom sempre lembrar que na atividade do parlamentar (vereadores, deputados e senadores), quantidade de proposições quase nunca será sinônimo de qualidade.